Trilhos Serranos



Quem, como eu, tem queimado as pestanas na investigação e divulgação da HISTÓRIA LOCAL, só podia regozijar-se com a iniciativa que tiveram os atuais responsáveis pela Santa Casa da Misericórdia, no sentido de deixarem, em livro, a colaboração dada às FESTAS LOCAIS de S. Pedro, integrando as MARCHAS POPULARES.

Fiquei a saber pelo telefone (iniciativa sua) que o meu amigo algarvio, colega que foi de liceu em Lourenço Marques, de seu nome completo Bertino Sequeira Nunes, hoje professor de História aposentado,  vinha fazer a PASSAGEM DE ANO no HOTEL ASTÚRIAS, no Carvalhal, integrado num grupo de 50 pessoas. Andariam por Lamego, por Viseu e arredores de Castro Daire.

Aldeia  de Cujó. Ano de 1955. No chão uma tampa de chapa solta. Um rapaz de 16 anos de idade ao lado.. Uma ideia. Um caco de telha partida. Um desenho feito sobre a chapa. Uma ma safra. Uma maceta de pedreiro. Uma talhadeira afiada na «Tenda  dos Ramalhos» onde se faziam também enxadas, trilhos para carros de vacas, sovinas, pregos, cravos, brochas de cabeça piramidal, ferraduras para equinos, asininos e outras bestas, testeiras e chapas para tamancos.
Mãos calejadas, tenros músculos afeitos ao cabo da enxada, caneta com que se escreve, ainda hoje, a narrativa camponesa, cada vez com menos protagonistas disponíveis, sinal de que acabou, para muitos, a escravatura e o apego milenar à terra, à pastorícia e agricultura, escravatura que começava obrigatoriamente nos verdes anos de criança e se estendia à idade corcunda e enrugada da velhice. Gerações após gerações.

Há muitos anos, para não dizer desde que me lembra, a QUADRA NATALÍCIA, bem ao contrário da alegria que resulta das cores, das luzes e luzinhas, das prendas e prendinhas que parecem alegrar o mundo inteiro, me deixa algo depressivo e ansioso que acabe a festança. Sinto-me rigorosamente um marginal. Quando me pergunto porquê, não encontro resposta a contento, mas creio atribuir isso à contradição detectada, logo em criança, entre o que se dizia do MENINO JESUS, que nascera para salvar o mundo das injustiças e eu não considerar JUSTO andar, descalço, roto, esfarrapado, remendado e às vezes com fome.


PALAVRAS CRENTES COM SENTIDO

"Quantos anos são passados? 
«A vida é um ai que mal soa». Agora, quase no fim da jornada, os dois filhos em Lisboa, criados e educados com respeito pela sua personalidade, tolerância bastante com a rebeldia de jovens sempre a quererem mudar o mundo, cabelos compridos a seu jeito, brinco na orelha segundo o seu estético conceito (tão indiferentes, quanto eu, à matriz do diz-que-diz sobre o pentear, o vestir, o ser e o estar, peças que não encaixam no lego da cultura paroquial), jovens de um tempo que vê ruir e emergir códigos de condutas e de valores diferentes, tempo de globalização, de fácil comunicação à distância (...) quantos anos são passados, perguntava eu?