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segunda, 28 agosto 2017 20:27

CUJÓ: UMA GENEALOGIA (1)

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HISTÓRIA VIVA

Como deixei escrito há anos, no meu site «trilhos serranos»  e no «Notícias de Castro Daire» a primeira «caixa do correio» chegou a Cujó, no ano de 1911. O depositário dela foi João Duarte Pereira, um cujoense cujo nome e exercício de cidadania, em toda cabeça esclarecida e conhecedora da HISTÓRIA LOCAL, em todo o tempo e lugar, dignificam o nome da terra onde foi nado e criado. Eu colhi essa a notícia no jornal «O Castrense», nº 16 (I Série), de 28 de Maio de 1911, aquele que levou a novidade até todos os seus leitores.

É que, ao tempo,  ser depositário de uma caixa de correio, não era para qualquer um. João Duarte Pereira, era um cidadão com vida pública conhecida e de letra cursiva deixada em documentos por si assinados, ou mesmo redigidos. No ano de 1888 era ele o Presidente da Junta da Freguesia de S. Joaninho (que integrava a aldeia de Cujó) e, nessa função, deu o seu aval à «suplicação» feita por vários moradores da freguesia que protestavam, junto da Câmara Municipal, contra os moradores das Monteiras que estavam a apoderar-se, indevidamente, dos terrenos baldios comuns às duas freguesias, isto é, baldios municipais. Publiquei tudo há bastantes anos. Para saber é preciso ler.

TRILHOS - RED. - CópiaMas, para além disso, não foram poucos os anos que este cidadão integrou  o «Tribunal de Júri», de Castro Daire, instituição que, no quadro da Justiça Portuguesa, remonta ao ano 1826. Segundo  a legislação constitucional em vigor, esse TRIBUNAL era composto por juízes e jurados, cujas competências se estendiam a casos civis e criminais. Finda a Monarquia e implantada a República, a «Constituição de 1911» assinala a intervenção do Júri como facultativa em matéria civil e comercial, sendo, porém, obrigatória nos casos criminais «quando ao crime caiba pena mais grave do que a prisão correcional e quando os delitos forem de origem ou de caráter político». Com a «Constituição Política da República Portuguesa de 1933»,  que vigorou até ao 25 de Abril de 1974, o «Tribunal do Júri»  desapareceu do articulado legal, vindo a constituir-se recentemente, de forma esporádica, quando requerido por uma das partes.

Foi num Tribunal destes que João Duarte Pereira foi «jurado», o cidadão que viria a ter por netos, entre outros,  Marcelino Duarte Pereira e Amadeu Duarte Pereira, os dois primos que estou a abraçar na foto que ilustra esta crónica.  Ambos amantes da HISTÓRIA, oferecem me dizer sobre cada um deles o seguinte:

05042009002 - Cópiaa) MARCELINO: deve-se à sua persistência e teimosia junto das instituições políticas locais (Junta de Freguesia e Câmara Municipal) o MONUMENTO alusivo ao «povo trabalhador, honesto e laborioso de Cujó», aquele obelisco levantado à entrada da povoação, no lado esquerdo, para quem entra pelo lado de S. Joaninho. Quem duvidar disso, deve ver o vídeo que fiz sobre o evento, alojado no Youtube, em 06-09-2011, e ter presente as palavras proferidas na oportunidade pela, então, Presidente da Câmara, Eulália Teixeira e Presidente da Junta, António Silva. 

d) AMADEU: deve-se-lhe este  meu apontamento histórico. Ele, com a ideia encasquetada na cabeça de fazer a «ÁRVORE GENEALÓGICA DA FAMÍLIA» não hesitou em arcar com as despesas e as maçadas que resultam em  meter o nariz  nos arquivos da Paróquia de  S. Joaninho, da Paróquia de S. Cristóvão, no Rio de Janeiro, no Arquivo Distrital de Viseu e também no Posto de Registo Civil das Monteiras. Disposto que estava em descobrir, não apenas os passos do seu avô João Duarte Pereira, homem de política, de justiça e de letra cursiva e da caixa do correio, mas sim e também aclarar as origens, o nascimento e a vida da avó Florinda, mulher analfabeta, de origens obscuras e de apelidos alternantes nos seus documentos de identificação: ora  «Correia», ora  «Amélia de Carvalho».

Feito isso, seguro de que o seu registo de nascimento não estaria em qualquer nobiliário do Reino, (já que se tratava de gente humilde) depois de ultrapassar  todas essas montanhas burocráticas, munido de documentação bastante,  deu-se ao trabalho de digitá-la e a entregar-ma de mão beijada numa PEN, atirando para os meus ombros a carga de a coordenar, reformular,  interpretar e divulgar da melhor forma que entendesse. É o que estou fazer, com pena minha de constatar tardiamente que,  pelo trabalho que ele realizou, não o ter como parceiro de investigação há mais tempo,  pois, pelo exemplo, provado fica que faríamos uma boa parceria, instituição hoje tanto em moda, sobretudo ligadas à política e à economia.

Face a tudo isso, bem poderei dizer: ele pelo trabalho feito e sensibilidade revelada para navegar no fio do tempo, acompanhado pelos restantes membros da família, não deslustra o nome dos seus antepassados, nomeadamente do seu avó João Duarte Pereira que, em Cujó, fez o que pôde no desenvolvimento das comunicações, da política   e da justiça.

Bilhete - rEDA minha investigação histórica, leva-me hoje a colocar  a hipótese de ter sido ele, com experiência que teve como «jurado» no «TRIBUNAL DE JÚRI» de Castro Daire,  o responsável pela «costumeira» que reveste a forma de TRIBUNAL na cerimónia da «ENTRADA AOS SERÕES» a que eram submetidos os mancebos da aldeia, tal como deixei escrito no meu livro «Cujó, uma terra da Riba-Paiva», editado em 1993e recentemente «representada» na  EIRA DA FRAGA por um conjunto de jovens que resolveu dar a conhecer aos mais novos os costumes antigos. 

Foram, pois, as pesquisas do meu primo Amadeu Duarte Pereira que me  levaram a entrar, mais uma vez,  no comboio da HISTÓRIA de Cujó e a fazer a viagem de que deixo aqui cópia do primeiro BILHETE, manuscritoe respetivos dizeres, v.g. documento identificador de quem, no comboio da História, viaja comodamente  na carruagem plebeia, ciente de que a nobreza não está no sangue, mas na verdade, na dignidade e na honra que  herdeou dos seus antepassados e que o acompanham  dentro da humilde bagagem que transporta em vida:

«Ilustríssima Senhora Rodeira

Esta criança nasceu no dia 27 deste mês de Outubro. Pedeçe que se chame Felorinda. Os padrinhos que sejam os seguintes:

Padrinho, Sr. José Correia, caixeiro do galego assistente na Praça da Ansa  e a Senhora Emília de Jesus, Rossio de Baixo, moradora na casa do Sr. João Ferrador, defronte do Sr. João Jorge. Pedeçe que a Senhora Rodeira a entregue a uma ama que seja boa e que a trate bem do que receberá boas alviças e mais a ama».

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.