DR. ARMÉNIO DE VASCONCELOS.
Recentemente, via telemóvel, o meu interlocutor, pessoa amiga, disse-me em discurso direto:
- Amigo, estou muito doente, mas ainda não perdi a esperança de ir consigo às pútegas, na serra do Montemuro.
Era a voz do Dr. Arménio de Vasconcelos, (de momento a residir em Leiria) um cidadão que conheci em 1985, quando me pediu a colaboração no projeto destinado a fundar, no concelho de Castro Daire, o jornal que fizesse eco da nossa história, cultura, usos, costumes e tradições, enfim, que levasse ao mundo a vida os “quefazeres” e “pensares” das gentes montemuranas.
Reuniu em torno desse projeto alguns munícipes que já faziam ouvir as suas vozes na imprensa regional e fundou “A VOZ DO MONTEMURO”, jornal de que foi também DIRETOR. Apenas no ano de 1985. Sol de “pouca dura”, devio às contingências da vida. Mas nesse periódico ficaram, em letra redonda, os contributos de colaboradores, tais como António Argentino, Raul Cardoso Dias e outros, que jamais alguém voltará a escrever. E eles também não, pois já são ambos falecidos.
O Dr. Arménio de Vasconcelos, advogado de profissão, vocacionado para exercer a sua cidadania na área da CULTURA, apegado à região do Montemuro, de onde é originário, resolveu também fundar na humilde e ignorada aldeia do Gafanhão (Além do Rio) a CASA MUSEU MARIA DA FONTINHA, em memória da SENHORA que deu nome à CASA, posteriormente convertida, em MUSEU, cumpridos que foram os trâmites legais.
E ali, naquele espaço, se reuniram obras de pintores e escultores de renome mundial e nacional, só vistos em museus sitos nas grandes urbes citadinas. Uma novidade no mundo rural e daí que esse EQUIPAMENTO CULTURAL tivesse o merecimento de ser inaugurado com a presença de Sua Excelência, o Presidente da República, RAMALHO EANES.
De momento não é minha intenção deixar aqui o historial desse MUSEU. Não. No momento em que, em discurso direto, via telemóvel, soube do “estado de saúde” desse meu amigo, tenho por objetivo sublinhar a sua vocação social, a sua entrega aos outros, a sua solidariedade e até “benignidade e tolerância” para quem, em meu juízo, não merecia tal. Bondade sua e recusa minha.
E vem este inciso a propósito da iniciativa que ele teve de fundar a “ACADEMIA DE ARTES E LETRAS LUSÓFONAS” com o logotipo legendado em redondo e na base a frase latina “VERITAS PER ARTEM”. (Ver foto).
Fui convidado para ser “académico fundador”, mas declinei frontalmente o convite, dizendo-lhe “olhos nos olhos” os fundamentos da minha “escusa”. E neles estava a falta de coincidência existente na “benevolência e tolerância” que o guiava na admissão de “fundadores” aderentes e o “rigor, exigência e merecimento” que, em meu juízo, faltava a alguns daqueles que me foram identificados e se sentiam muito lisonjeados com isso. Pois sim, que assim fosse, mas comigo não.
Discordantes, mas sempre amigos, o projeto avançou. A ACADEMIA foi fundada, deu, seguramente, cumprimento às atividades culturais delineadas nos seus anos de vida e, chegado ano de 2017, fui convidado a estar presente numa cerimónia ligada à “IMPRENSA SEM FRONTEIRAS” levada a efeito naquele espaço cultural, estando presentes cerca de 60 “académicos”. Na circunstância seriam atribuídos alguns DIPLOMAS a pessoas de reconhecido MÉRITO PÚBLICO.
Fui um dos contemplados, não sem deixar a necessária referência ao facto, ao paradoxo de estar a ser galardoado pela ACADEMIA DE LETRAS E ARTES LUSÓFONAS”, a mesma da qual me recusei a ser fundador.
São as encruzilhadas da vida, neste mundo cão, mas também se gente boa sem ressentimentos nem agravos. E, por vezes, somos obrigados a ser GRATOS e a devolver MÉRITOS, às instituições que MÉRITOS lhes recusámos.
Nesse ano de 2017, fosse pelo cansaço que exigiu a logística de orientar, em Portugal, 60 acadêmicos brasileiros, fosse pela debilidade de saúde, notei uma diferença assinalável na eloquência costumeira e própria do Dr. Arménio. Não obstante essa evidência, afável e afetivo, se mostrou, como sempre, para com todos os presentes. E igual situação cansaço notou também o nosso comum amigo, Meritíssimo Juiz Desembargador Pedro Antunes, que se deslocou propositadamente ao concelho, por via dessa cerimónia. E ele me fez ver, igualmente, os seus cuidados.
Vim a saber depois que, finda a tarefa, o Dr. Arménio foi subtido a uma cirurgia e da qual jamais recuperou a saúde que tinha dantes. Acompanhando a sua lenta evolução, em 2018 (foto ao lado) desloquei-me a Almofala, concelho de Figueiró dos Vinhos, mais o meu primo Manuel Carvalho Soares, também seu conhecido, a fim de termos «dois dedos de conversa».
São dessa nossa visita as fotos que ilustram estas linhas. E elas vêm hoje ao público, por esta via, na certeza de que “uma imagem vale por mil palavras”. A sua debilidade física é bem parente e visível.
Ele e a esposa, minha colega de profissão, Dra. Lucília Rego, receberam-nos com a hospitalidade que lhes é própria. E dessa viagem ficou o registo. E se débil de saúde o encontrámos então, débil de saúde se encontra, agora. Dito por ele próprio, via telemóvel, a este seu amigo. E face a isso tudo, resolvi escrever e ilustrar estas linhas, nessa minha página, desejando-lhe as melhoras, na esperança de que ele me faça a surpresa, aparecendo, de rompante, por cá, decidido a subirmos à Serra do Montemuro à procura de pútegas, agora, no mês de maio.
E não resisto a colar aqui o link relativo ao vídeo que alojei no Youtube, no ano de 2009, onde ele, Dr. Arménio, poeta, declama o poema da sua autoria com o título «Vem Amigo, Eu te convido». Um hino homérico de chamamento à serra e à absorção das suas cores, aromas, sons e formas. Só visto e ouvido, ali mesmo, no PENEDO DA SAUDADE, no Gafanhão.
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