SEM FRONTEIRAS
Sem fronteiras
Se diz ele, o aniversariante.
Gente culta, importante
Unida em jantar de gala
Onde se regala
(Bem ou mal)
Só
Quem tiver grana
Para tal
E vestir paletó.
Sem fronteiras
Se diz ele, o aniversariante.
Por eletrónico correio
O convite me chegou
Vindo de pessoa amiga.
Quando vi o meu nome no meio
De gente com tal gabarito
Lido o escrito
Até ao fim
Logo disse para mim
Que só
Podia ser engano.
Pois, podia lá ser
Que esse meu amigo
Farto de conhecer
Há tanto ano
Este rústico aldeão
Quisesse ver-me de paletó?
Mesmo só
Uma provocação
E tal ousadia
Seguramente ele não faria.
Gente académica, importante
De mim tão distante
Que na serra, na ucha
Em vez de paletó
Acompanhado ou só
Uso a capucha
E renego a "sociedade"
Que para se vestir
Assim
De seda ou de cetim
Em tempos que lá vão
Bebia o suor do camponês
Enfiteuta, ganhão
Ou rendeiro português?!
Gente culta
Importante
No trato e no vestir
(Paletó e longos vestidos)
Em jantar de gala
No aniversário de um jornal
Que se diz sem fronteiras!
Paradoxal!
Gente culta, importante
(Muitos livros lidos)
Não despiu as barreiras
Visíveis, sociais
E culturais
Dos tempos idos.
Ó Diógenes amigo
Eu, que te sigo
A lição de vida,
Te convido:
Deixa o teu barril
Abandona a culta Atenas
E vem sem demora
À cidade de Lisboa
Dos anos dois mil e dezassete
Onde verás o erro que fizeste
No dia
Em que deitaste fora
(Por supérflua que era)
A escudela
Com que bebias.
A criança, mãos pequenas
Em concha a saciar a sede
Não é lição para pensador.
Recupera-a!
Ou, então, sem pudor
Despe as peles
Que recendem filosofia
E não percas um só
Momento:
O corpo enfia
Num paletó
Asa de grilo
Na alta costura adquirido
Pois o elevado pensamento
A alta cultura
O sublime estilo
Não é o que pensas nem sentes:
Tudo está no comer
No vestir
E no beber
Em trajes de gente!
Abílio/10/02/2017