Trilhos Serranos

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sexta, 21 janeiro 2022 12:44

ONDA DE GOZO

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O SIGNO: SIGNIFICANTE E SIGNIFICADO

Passados tantos anos, quando menos se espera, essoutra companheira em sonhos me aparece, tal qual era e durante a noite inteira a dormir comigo tece a teia de veleidades, sortilégios e enganos próprios da mocidade.

 

Eu sou o seu senhor, ela é a minha gueixa. Eu sou o seu dono, uso-a e não se queixa. Quando nela me ponho, ora fria, ora quente, ela excita-me tanto o corpo e a mente que, às vezes, sem querer, a fantasia e o prazer tornam-se dor, sangue e pranto.

Maneirinha, dócil e novinha, carregada de atributos, quando a agarro nos punhos, a ela coladinho, não há mais escondidinho que fique por descobrir. E então, devagarinho ou de rompão, é descer e é subir em todo o campo, toda a linha. No litoral ou na raia, na costa ou na praia, quer de noite, quer de dia, nessas deambulações pelo Reino da Natureza com inteira liberdade, ela se deixa conduzir e me conduz a mim também. Sinto-lhe as pulsações. Os seus movimentos e vibrações no constante vai e vem,  são os meus, são as minhas. Os dois formamos um só corpo.

De linhas originais, é por demais o orgulho que sinto dela ser só minha. Mas o meu encanto,  o meu enlevo não se ficam por aí. Nem também o meu desgosto. Das cores com que se vestia algumas vezes a despi e despi também a mim, fosse em Janeiro ou Agosto. Se a memória não me foge, recordo ainda hoje (digo-o e não minto) em que contexto a possuía: à sombra da casuarina, do coqueiro, da palmeira, nos  trópicos areais desse exótico Oriente, fascínio de toda a gente desde Vasco da Gama a F. Mendes Pinto.

Nascida noutro hemisfério, produto de culturas, religiões, técnicas e civilizações, usos e costumes diversos pelo Índico e Pacífico dispersos, tudo isso nela se vê. Daí talvez o mistério, daí talvez o porquê de, tantos anos depois, de passados tantos sois, não esteja ainda esquecida e faça parte de mim no sonho e na vida.

De linhas elegantes, bem constituída, bela e  atrativa, para que se si, nada, mas nada se esconda, eu quero deixar aqui com toda a clareza e verdade o seu bilhete de identidade:  

Origem: japonesa; 

Marca: Honda. A minha primeira mota, aquela que na década de sessenta, nas estradas de Moçambique, em marcha rápida ou lenta, sendo eu ainda moço, mas já propenso a ficções, apetrechou o meu pensamento com quatro novas noções: liberdade, gozo, espaço e tempo.

Abílio/1980

NOTA: depois de ler o texto veja o vídeo (cujo link  se segue) e teste o significado das palavras com o seu referente. Melhor direi; teste a sua MENTE.

https://youtu.be/NN7Ubvao4jc

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.