Trilhos Serranos

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quinta, 25 junho 2020 18:36

MINAS ROMANAS DE «TRESMINAS»

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O VALOR DA HISTÓRIA

Ontem, um programa que vi na televisão, cerca das 21 horas (já não sei em que canal, nem estou para ir confirmar), levou-me até TRESMINAS (Trás-os-Montes), sítio de exploração de ouro levada a cabopelos romanos durante o seu domínio territorial.

TRESMINAS - Cópia

Numa visita guiada, eloquentemente fundamentada, desci ao interior da terra, corri as galerias e OBSERVEI as crateras que, a céu aberto, me levaram ao tempo do IMPÉRIO que, por sê-lo, sugando as riquezas naturais do solo e subsolo conquistados, deixou nesse mesmo território o tesouro da LINGUA, a mesma que, ela própria, transformada e funcional, sugando os dialetos ibéricos em uso, serviu de cabouco ao edifício que hoje habitamos e no qual a “falar e a escrever nos entendemos”.

Camões, o príncipe das LETRAS PORTUGUESAS, habitante que foi deste edifício, atento às origens da matéria usada na construção e à sua necessária metamorfose comunicante, diria, sábia e concisamente, na estância 33 do Canto I, de «Os Lusíadas»

 

 

Sustentava contra ele Vénus bela,

Afeiçoada à gente Lusitana

Por quantas qualidades via nela

Da antiga, tão amada sua, Romana;

Nos fortes corações, na grande estrela,

Que mostraram na terra Tingitana

E na língua, na qual, quando imagina,

Com pouca corrupção crê que é Latina”.

 

Moeda romana - CópiaMas não é sobre a raiz e a evolução da LINGUA MATERNA que faço este apontamento. Ele deve-se, tão só, aos caminhos de conhecimento que aquele programa me abriu e possibilitou situar no tempo uma moeda romana que, há anos, integra o meu espólio numismático.

Em mau estado de conservação pedi, em tempos idos, a um colega meu que dizia ter amigos e especialistas nessa área de saber, a residirem em Lisboa, que tentasse, junto deles, situá-la no tempo de cunhagem e circulação. Que sim, senhor. Levou a moeda e passado tempo bastante devolveu-ma sem as informações esperadas.

Com os rebordos danificados e com os elementos escritos no “anverso” e “reverso” em estado semelhante, baldados foram os meus intentos. E, tal como foi, recolheu a PENATES.

Mas eis que, ontem, cerca das 21 horas, pela janela do mundo dentro, me entrou esse programa sobre TRESMINAS. E eu, atento às palavras da senhora ARQUEÓLOGA que conduzia a visita e também às imagens ilustrativas, pareceu-me vislumbrar alguns DENÁRIOS ROMANOS e, no “anverso” de um deles, o perfil que imediatamente identifiquei como sendo do IMPERADOR ADRIANO.

google-2 - CópiaPeguei no comando da box, fiz marcha-a-atrás e, de câmara fotográfica em punho, fiz pausa na altura certa. Fotografei a IMAGEM. É aquela que colo em primeiro lugar, à direita, para podermos comparar com o perfil daquela que é propriedade minha, posta a seguir, à esquerda. E, posso dizer que, aquilo que o amigo do meu amigo, especialista em numismática, não conseguiu, parece que foi por mim decifrado.

Comparados os “perfis” do imperador, fundidos no “anverso” das duas moedas, mau grado o estado em que a minha se encontra, nomeadamente a legenda identificadora, quase sumida, delida e, em parte, desaparecida, ainda conseguimos ler as últimas letras, a saber, ...”IANOS”, que vem a ser as últimas letras de “ADRIANO”.

Eureka!

A primeira dificuldade estava ultrapassada. A moeda é um DENÁRIO do tempo do Imperador ADRIANO que nessa função esteve entre os anos de 117 a 138. Imperador que faz parte a dinastia dos Antoninos e que integra a lista dos “cinco bons imperadores”.

Google.1 - CópiaMas faltava-me saber algo sobre as figuras fundidas no “reverso”, uma delas claramente romana, pois assim o dizem as pregas da toga, e a outra, um presumível camponês ibérico, de saiote, chapéu de aba larga, a mão direita a cumprimentar o romano e a esquerda levantada ao alto, assim a modos que de quem assina um contrato.

Na minha BIBLIOTECA, ainda que espiolhada a preceito, não encontrei informação, nem resposta. Vejo-me, portanto, obrigado a navegar fora desse “mare nostrum” e iniciar a navegação e conquista através “mare magnum” da Internet, a partir do GOOGLE. Na bagagem levo comigo o DENÁRIO identificado nas TRESMINAS e o meu, ambos ligados ao IMPERADOR ADRIANO.

Entrei pela porta DENÁRIOS DE ADRIANO (imagens) e foi um desfilar de moedas, dignas de encher o olho a quem investiga. Mas, espiolhando os dois lados delas, onde isso era possível, as duas imagens constantes no “reverso” daquela que é propriedade minha, nem cheirar. Duas figuras, uma delas irrefutavelmente romana e a outra, camponês ibérico, chapéu de aba larga, saiote, mão esquerda levantada, deixou-me pendurado na ignorância de partida.

A moeda recolheu novamente a PENATES à espera de mais estudo e informação. Mas sei que deixo por herança aos meus filhos uma peça que, até ver, não encontra símile no mar magno da Internet e o amigo do meu amigo, especialista em numismática, não conseguiu identificar, mesmo recorrendo, segundo disse, ao Museu de Numismática, em Lisboa.

Ela, antes de chegar aqui,  andou entre os vinténs e os patacos que, fora de uso, perduraram perdidos por buracos e baús no Monte das Fontinhas, concelho de Castro Verde, que viu nascer a minha mulher, Mafalda de Brito Matos Lança Carvalho. Não muito longe está o complexo mineiro de Aljustrel explorado que foi nos tempos pré-romanos, romanos e pós romanos. O que significa que este DENÁRIO circulou por aquelas bandas, por lá teve vida e por lá morreu, até que eu o ressuscitei e o trouxe à luz do mundo, aqui mesmo.

ferreiro-globoE isso, atendendo aos tempos que correm, permite-me terminar em tom um tanto ou quanto provocatório. Aquele “aperto de mão” entre um romano de toga e um ibérico camponês de saiote e chapéu de aba larga, seja ele de cumprimento ou firmação de um contrato, tão ao jeito dos nossos negociantes de feira, nos tempos modernos (digamos do meu tempo) que apertavam sempre as mãos depois de fechado o negócio, bem como falarem assim, frente a frente, tal qual se vê na moeda, não seria possível nesta ano de 2020, devido à COVID-19 que, ao tempo em que escrevo este apontamento, a todos obriga a manter a «distância social» e a usar máscara.

E mais ainda. Aquele braço esquerdo levantado dobrado pelo cotovelo, punho fechado, bem distinto da conhecida saudação romana, braço estendido com a palma da mão virada ao solo, bem pode emprestar significado histórico longínquo, a todos os que, passados muitos séculos, nesse gesto refletem a simbólica de uma identidade e férrea vontade de destinção, face aos poderes imperiais. Será preciso mais?

É por estas e por outras que eu gosto de HISTÓRIA. Por estas e por outras que me apraz fazer uso das ferramentas institucionais que adquiri na forja da investigação, onde entrei e permaneci como aprendiz, sem, jamais, me cansar de “bater em ferro frio”.



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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.