Com efeito, no ano de 1714, a Confraria de S. Miguel veria subir os seus rendimentos de forma inesperada. As esmolas ofertadas ao Santo, sempre em crescendo, não tardaram a ser convertidas em bens e haveres. A Confraria tornou-se proprietária de terras, vinhas e casas, bem como administradora de capitais emprestados a juros, sob hipoteca e, qual Banco Rural, chamando a si, por insolvência, as fazendas dos devedores.E foi, também, nesse ano de 1714 que o Rei D. João V, através dos tribunais da «Mesa da Consciência e Ordens» e do «Desembargo do Paço», foi chamado a dirimir a querela travada entre os «oficiais da Câmara» e o «Prior de Castro Verde». Este último a querer parte do rendimento das esmolas e os primeiros a recusar-lhe tal pretensão.A que se devia, então, o acréscimo das esmolas e, por conseguinte, o aumento dos rendimentos?Num «Livro de Contas» (manuscrito) que começou a ser escriturado no ano de 1677, encontrei o seguinte auto, com um traço de cima a baixo como que a querer inutilizá-lo:«Aos vinte e dois dias do mês de Julho de mil setecentos e catorze anos, nesta vila de Castro Verde, nas casas da Câmara dela, estando juntos os oficiais da Câmara em presença do Ouvidor desta Comarca, porquanto, ora de presente, se havia divulgado que junto à igreja do Senhor São Miguel se houve aberto e descoberto uma fonte de milagre que Deus Nosso Senhor por intercessão do Santo a essa fonte concorre muita gente com algumas doenças e achaques e se divulga serem sãos por virtude da água da dita fonte com que se lavam e se tinha experimentado virtudes nelas e para que se houvesse cobrar as esmolas que os romeiros e devotos quisessem dar ao dito Santo para as obras que se querem fazer na dita Ermida e ser necessário haver pessoa fiel e de boa consciência que as cobrasse e desse de tudo contas, elegeram para ter este cuidado a António Martins da Lagoa do Sarilho, por ser homem de bom zelo ao qual mandaram chamar e, sendo presente, lhe encarregaram, debaixo do juramento dos Santos Evangelhos, que ele fizesse todo o cuidado em procurar arrecadar tudo o que se desse de esmola para as obras do dito Santo e delas dar conta. E ele recebeu o dito juramento e se comprometeu a fazer com todo o zelo e verdade como também lhe encarregaram cobrasse todos os anos os quatro alqueires de trigo de foro que lhe paga a este Santo Manuel Mestre, como herdeiro de José Pires, foreiro das terras do dito Santo e que cobrasse os ditos quatro alqueires de trigo deste ano de setecentos e catorze que é o primeiro ano depois da carga da conta atrás de que tudo mandaram fazer este termo que assinaram com o dito António Martins».
E D João V depois de prolongada demanda entre os «intervenientes» interessados na gestão do rendimento proveniente das esmolas, acabou por resolver a questão autorizando a que o «Prior de Castro Verde» estivessse presente na «mesa dos leilões» a par dos «Oficiais da Câmara», todas as vezes que se fazia a venda das esmolas recebidas. A partir daí passou a ter direito a «um terço» desse rendimento.NOTA: migrado hoje mesmo do meu velho site «TRILHOS-SERRANOS.COM» para este novo «TRILHOS-SERRANOS.PT»
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segunda, 02 setembro 2019 07:28
Escrito por
Abílio Pereira de Carvalho
CASTRO VERDE - S. MIGUEL
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Publicado em
História
Abílio Pereira de Carvalho
Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.