Trilhos Serranos

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terça, 20 agosto 2019 17:37

CHAIMITE

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GUERRA COLONIAL

Consulte-se qualquer livro de história, compendiada ou não compendiada, primária, secundária ou universitária,  ligada ao ESTADO VELHO ou ao ESTADO NOVO, consulte-se o GOOGLE e logo se descobrirá que a palavra CHAIMITE aparece necessariamente associada a MOUZINHO DE ALBUQUERQUE., e ao fim do IMPÉRIO VÁTUA, em Moçambique.

chaimite-1Não fora a batalha que pôs fim a tal IMPÉRIO, não fora ali a prisão de Gungunhana, a 28 de dezembro de 1895, por Mouzinho de Albuquerque e CHAIMITE seria um nome como tantos outros a identificar um lugar, uma povoação ou um qualquer acontecimento. Não fora isso e os fabricantes de material de guerra jamais teriam dado o nome «CHAIMITE» ao mais icónico veículo usado na GUERRA COLONIAL, a que o 25 de Abril de 1974, pôs factualmente fim.

Já me referi a esse acontecimento, quer em livro, quer em páginas digitais online, mas a recente colocação, com pompa, circunstância e explicação do evento,  de  um carro CHAIMITE  à entrada da vila de Castro Daire, ali junto ao INTERMARCHÊ,  leva-me a repescar para aqui parte do texto escrito, sem comentários de acrescento. Palavras para quê? Leia-se  somente o facto e as mentes.

chaimite-legenda-4Ora façam o favor de ler:

«VINTE DE MARÇO DE 2019. Os meios de comunicação social fazem eco da SOLIDARIEDADE MUNDIAL com MOÇAMBIQUE, devido à tragédia que vive em resultado do ciclone Idai. Ali, na costa oriental da África. Ali, o território que levou Pereirinha Balala, no Facebook (PICADAS DE TETE) a perguntar a João Pedro Garcia Monteiro  “como durou tantos anos a presença de Portugal (1505 a 1975) na Costa Oriental de África?

Pergunta que teria, seguramente, resposta diferente se fosse assim reformulada: “que povos viviam na costa oriental de África, quando os portugueses lá chegaram?

É que parece-me que vai sendo tempo de deixar de ver a África como “terra de ninguém”, pronta a ser ocupada e repartida pelos “conquistadores”, tal como se vê, lê e aprendeu em muita história compendiada. 

Da minha parte, que também por lá andei, aqui deixo o meu contributo.

“(...) Colonos. Exploradores ao serviço da ciência e do conhecimento, da Geografia, Botânica, Zoologia. África, terra de carreirismo militar, político, administrativo, mas também terra de degredo, de aventura e paludismo. Enfim, a partilha do continente africano em Berlim até à marcha inversa começada em Bandung, gemido de corpo espancado da África e da Ásia, vendido, explorado e dorido. 

Gungunhana - CópiaDécada de sessenta. Lisboa recusa a autodeterminação. Começa, então, a guerrilha no mato. Metralha. Bombas, minas nas estradas e picadas, massacres, napalm, catorze anos de guerra, tanto morto, tanto estropiado. Mas no mundo civilizado impõe-se o direito à liberdade e à independência dos povos. E, de Lisboa, o grito do 25 de Abril ecoa pelas Áfricas. Chega a Lusaca. Em Lourenço Marques os protagonistas da estátua equestre plantada na Praça do Município, desde 1940, ganham vida. 

Numa das placas de bronze, Gungunhana, fundido em posição de vencido, de pé, fronte caída, levanta a cabeça, fala e anda. De vencido passou a vencedor e, como antigo chefe do povo vátua, lembra ao seu opositor as humilhantes condições sofridas aquando da sua prisão em Chaimite: o fuzilamento dos seus conselheiros Manhune e do seu tio Quêto à frente de todo o seu povo no sentido de se impor pelo terror. A sua exibição como troféu de guerra e a divulgação por todos os cantos da Terra da fotografia que lhe tiraram no navio de guerra «Neves Ferreira», acompanhado da duas mulheres preferidas. Três rostos a espelharem a derrota. Passaram-se 80 anos. Tanto tempo e tão pouco tempo. Mudaram-se Mouzinhoos papéis. Mouzinho, até agora em posição de vencedor, mão direita na espada, a mão esquerda estendida em largo gesto de ordem dada, a mando do velho rei de Gaza ressuscitado, cavalga Avenida D. Luís abaixo, a caminho do Forte da Nª Sª da Conceição, aquele que foi o primeiro «presídio» onde os Portugueses assentaram arraiais à chegada, em 1782.

O mesmo aconteceu com António Enes, comissário régio, e todos os outros vultos coloniais senhores de praças e pedestais.

Uma lição de história, uma lição de vida. Porto de chegada, porto de partida.

Mudaram-se os nomes das ruas, das praças e das avenidas, curtas e compridas. Findou o jogo, acabou-se o pleito. A narrativa histórica mudou de sujeito. Os governados passaram a governantes. Os vencedores a vencidos. São aqueles, os nativos, que agora escrevem a sua História, que elegem os seus heróis mortos ou vivos, que os põem sobre pedestais para futura memória.

Acontece no mundo religioso e profano. Sempre. Aqui e agora eles são Mondlane, Samora e Chissano. Nada escapa. O topónimo Maputo volta a escrever-se no mapa. O topónimo Lourenço Marques arquiva-se, nos livros, na memória, nos arquivos, nos documentos, nas páginas da História. É o fim do Império Português».

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.