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quinta, 27 novembro 2014 13:34

POLÍTICA E JUSTIÇA (1)

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POLÍTICA E JUSTIÇA (1)

            Que coisas tão distintas elas são. E vem de longe essa distinção. Nada de promiscuidade entre elas.. Isso bem nos mostra a CARTA manuscrita, assinada pelo Meritíssimo Desembargador Bernardo de Lemos, dirigida ao seu amigo Abade António Bizarro de Almeida, de Castro Daire, a propósito da eleição de um deputado por «este círculo». Assim, tal qual se transcreve na ortografia da época e respectivas abreviaturas:

«Porto 6 de Julho de 1841

«O Visconde Francisco lá está hoje tb doente, tendo tido à noite bastante febre, mas creio que não será coisa de cuidado. O meu cunhado chegou hontem de Samodães e me encarregava de te dizer da sua parte o seguinte.

Vai-se proceder nesse circulo à eleição de um deputado em consequência da morte de Gonçalo J. da Svrª Lobo. O nosso comum amigo Aguiar, actual ministro do Reino, quer ser proposto para deputado por ahi, visto ter perdido o seu lugar pela entrada no ministério.
Nestes termos tu farás chamar o actual Administrador, António Duarte Pinto e lhe darás /
confidencialmente/ que temos a quase certeza de que elle fique Administrador do Concelho, porem para isto he necessário fazer serviço ao Ministério que o há de despachar e por conseguinte que vá dispondo as coisas de forma que possamos obter ahi os votos que nos for possível. Escrevas também ao capitão-mor de Cabril em nome e por ordem do meu cunhado para o mesmo fim, bem como ao filho, actual Reitor ou Abade em Alvarenga, para que compareça em Cabril para promover o mesmo.
Enfim, escreverás e farás de baixo de capa o que estiver ao teu alcance para fazermos triunfar uma pessoa a eu tanto somos obrigados, mas com a reserva da tua parte de forma que te não comprometas e sobretudo que não corras o menor risco.
Só com esta terminante cautela que eu te imponho da minha parte. Eu quero que promovas a eleição dita como se nomeia um substituto, podem meter o Dr. J. Alves de Maria Coelho, Juiz desta Relação. Não he elle muito da minha relação e se houvesse tempo outro se podia lembrar, porem assim vem recomendado de Lisboa e como não se possa propor outro que mais facilmente o devesse substituir, deixá-lo ir ao menos he dos nossos princípios. Todavia se for necessário com elle fazer alguma transacção he faze-la, o ponto está o primeiro. Mas repito da tua parte que nem haja comprometimento nem risco porque he so debaixo desta hypotese que sequer que tu cooperes. Mete os cães à moita e tu joga de fora. Chama do Duarte Ptº na forma dita e já que elle quer ter os prós tenha tb os percalços. Que elle trabalhe para colher o fruto da sua seara. Escreve ao Capitão das Bombas e ao filho na maneira apontada enquanto te lembrar, mas encastelado nas casas da Praça. Creio que sobre isto não he preciso dizer mais e que tu bem me entendes. Eu tinha protestado não dar nem escrever huma palavra sobre elleições, mas esta bem vês tu que vem jogada do baralho e então não há remédio – repetirei novamente que tu encastelado na casa da Praça he só de lá que arteiramente deves dirigir a operação. É bem de ver que o nobre Barão faça das suas. Tu irás tomando nota dos seus passos para em tempo ser levado tudo em conhecimento do Ministro a quem elle decerto vai hostilizar. Creio que me entendes.



Ads. Meu Amº tem saúde e diz-me em que termos vae a demanda.
Teu do cor.


B. de Lemos»

            Os amigos viram bem! Tudo feito à socapa, sem dar nas vistas. E seria da casa da praça que, «arteiramente», o abade devia dirigir a «operação». «Mete os cães à moita e tu joga de fora». É o conselho e o empenho do Senhor Desembargador Bernardo de Lemos. E as coisas depois aparecem assim como que «caídas do céu». Ontem e hoje. Face ao que me atrevo a dizer que ao contrário do que alguns políticos, juristas e comentadores encartados, inteligentemente nos querem fazer crer, que a POLÍTICA E a JUSTIÇA são duas SANTINHAS do mesmo PANTEÃO, adoradas em altares separados, elas são para mim duas PUTAS do mesmo BORDEL, sempre dispostas a servirem a cama das conveniências.

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.