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segunda, 16 dezembro 2013 22:24

CASTRO DAIRE, IGREJA MATRIZ

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INTRODUÇÃO

Em 2005, aquando de eleição do Papa Bento XVI, os comentadores de serviço dividiam-se entre os que alvitravam que a cadeira de S. Pedro seria ocupada por um cardeal europeu e os que desejavam que fosse um cardeal oriundo do Terceiro Mundo. Na altura escrevi e publiquei uma crónica em que apresentei os meus pontos de vista, crónica donde retiro as seguintes ideias:


capa1Como nesta eleição entra a "inspiração" do Espírito Santo, acabou por ser eleito um papa europeu que escolheu o nome de Benedictum, no meu entender o nome de um Santo negro, muito pouco falado nos púlpitos que existem por essas igrejas afora. Foi um santo que viveu no século XVI, cujos ascendentes escravos eram originários da Etiópia. De modo que, eleito e escolhido o nome  por inspiração divina, temos  «Benedictum XVI», dois em um, único e verdadeiro, simultaneamente branco e negro, a contento dos que desejavam um Papa terceiro-mundista, negro que fosse, e os que desejavam que continuasse a ser branco e europeu. Um dom de Deus! Branco de sua natureza, negro de seu nome, o primeiro sinal de paz e conciliação entre a família cristã estava dado. E aqui se colam imediatamente as palavras e intenções de Bento XVI, quando disse colocar-se «ao serviço do grande bem da reconciliação e da harmonia entre os homens e os povos, porque o grande bem da paz é sobretudo um dom de Deus, que temos de defender e construir entre todos».(in «Notícias de Castro Daire» e www.trilhos-serranos.com»)

Ora, aconteceu que, neste ano de 2013,  a conjugação dos astros proporcionou ao mundo três  acontecimentos de eco planetário. O primeiro foi a renúncia de Bento XVI, a segunda foi sentar-se, na cadeira vaga de S. Pedro, um Papa, agora sim, oriundo do Terceiro Mundo, que adoptou o nome Francisco, cuja eleição e acção tem impressionado o mundo inteiro;  o terceiro foi a morte de Nelson Mandela, um homem também do Terceiro Mundo, que, não sendo um santo, mas sendo negro, igualmente, impressionou todo mundo pelo exemplo que deu de bondade, de tolerância e de perdão, em defesa da paz.
Mas se os astros se conjugaram nestes três acontecimentos de grandeza universal, um ligado ao desapego do poder e mordomias, outro à esperança do nascimento de uma ECLLESIA NOVA e outro ligado à esperança do nascimento de um HOMEM NOVO, também parece que, neste ano de 2013, os mesmos astros se não alhearam de acontecimentos menores, de natureza local. Refiro-me ao facto que, neste obscuro cantinho do globo, sem prejuízo de terceiros, envolve a parceria feita entre dois cidadãos, um CATÓLICO PRATICANTE (o director do jornal «Notícias de Castro Daire») e um SOCIALISTA, REPUBLICANO E LAICO  (eu próprio), parceria sem a qual não seria dado à luz este livrinho: «Castro Daire, Igreja Matriz», com a capa, título e subtítulo que estão a ver.

Inspirado não sei por quem, mas talvez pelos eventos e exemplos acima referidos, ou pelas diferentes cores, odores e quentes ares tropicais que respirei muitos anos, ao sul do Equador, concebi o título e o subtítulo, por forma a que o «T», desempenhando embora a função que lhe cabe na escrita, assumisse mais amplo significado. Colocado assim, ele não só entrelaça o título e o subtítulo (digamos o profano e o religioso de mãos dadas) como empresta ao livro um valor que o ultrapassa a si próprio, pois ao destacar a «CRUZ DE SÃO FRANCISCO» assim designada por ter sido adoptada pelo frade cujo nome foi escolhido pelo actual Papa, me leva a destacar e a valorizar, de entre todas as cruzes (e são tantas) uma CRUZ bem pouco usada na comunidade cristã, senão mesmo ignorada pela maioria dos crentes, ao contrário da cruz latina, essa sim, abundantemente dispersa, vendida e pendurada ao peito de toda a gente a rematar os finos e os grossos cordões de ouro. Vá lá saber-se o por quê da opção dos ourives e dos crentes, preferindo a cruz latina à cruz franciscana.
Mas para que o leitor acompanhe melhor o percurso racional e afectivo desta minha inspiração/opção/acção terei de levá-lo até ao significado simbólico que tem o «T», decalcando os dois textos que se seguem, marcados com as letras A e B:

A - «O TAU é uma cruz com a forma da letra grega TAU (T). Além de ser um símbolo bíblico é a última letra do alfabeto hebraico e a 19ª do grego, capa-2derivado dos Fenícios e correspondente ao "T" em Português.
Na Bíblia o "Tau" foi utilizado pelo profeta Ezequiel: "E a glória de Deus de Israel se levantou do querubim sobre o qual estava, e passou para a entrada da casa e clamou ao homem vestido de linho branco, que trazia o tinteiro de escrivão à sua cintura. E disse-lhe o Senhor: passa pelo centro de Jerusalém e marca com um T as testas dos homens que suspiram e que gemem por causa de todas as abominações que se cometem na cidade". (Ez. 9:3,4)
O Tau é a mais antiga grafia em forma de cruz e significa Verdade, Palavra, Luz, Poder e Força da mente direccionada para um grande bem.
O Tau, é a convergência das duas linhas: verticalidade e horizontalidade, significam o encontro entre o Céu e a Terra. Divino e Humano.
Em 1215 o Papa Inocêncio III prega um novo símbolo cristão e São Francisco, estando presente nesta reunião, assume o Tau como símbolo de sua Ordem Religiosa: a Ordem dos Frades Menores. Santa Clara, quando tratava dos doentes e enfermos com a imposição do TAU, invocava a Deus que curasse aqueles que padeciam e sofriam.
(...)
S. Francisco selava o que escrevia com o TAU, para significar a densidade do amor de Deus, concretizada na Cruz do Cristo, sinal de Salvação. Assim podemos ver na mensagem que redigiu a Frei Leão, e que este conservou até ao fim dos seus dias. Hoje está em exibição na Basílica de S. Francisco em Assis: "Sejam os campeões do TAU!» (Wikipedia)

Mas, não nos fiquemos agarrados apenas a este símbolo cristão e sua explicação. É que, ainda que o livro trate da história da Igreja Matriz de Castro Daire, há nele alusão à morte do padre jesuíta Sebastião Vieira, natural desta vila, martirizado no Japão, no século XVII,  depois de ter andado por Macau, território da China, onde os Portugueses aportaram quatro séculos antes de, por sua vez, os chineses aportarem, depois, em Castro Daire. Nós, no século XVI, levando para o oriente os nossos produtos, a nossa cultura, as nossas crenças e os nossos símbolos religiosos. Eles, no século XXI, em sentido inverso, fazendo exactamente a mesma coisa, trazem para ocidente os seus símbolos religiosos, as suas crenças, a sua cultura e os seus produtos.
Ora, face a esta realidade histórica e humana, face a este giro da Terra em torno de si própria, uma areia cósmica a vaguear no espaço sideral, num tempo de globalização e de respeito pelo que é diferente (coisa que eu aprendi há muito tempo na cosmopolita cidade de Lourenço Marques, banhada pelo Indico, babel de gentes, cores, línguas e culturas) faz sentido referir aqui também o «Tau» provindo das terras do Sol Nascente. Assim:

B - «O Tao existiu para os chineses, muito antes de os homens se apropriarem dele. O sentido exato da palavra chinesa é: caminho, via (...) poder-se-ia considerar (...) como o regulador da sua alternância. Assim ele explicaria a regra essencial que se encontra no fundo de todas as mutações, reais ou simbólicas, o que permitirá considerá-lo como um princípio de ordem, regendo indistintamente a actividade mental e o cosmos. Poderíamos compará-lo, com todas as reservas, à noção estóica do Logos, essa razão imanente do universo, no seu conjunto, e em todo o ser, no seu destino particular. Na perspectiva de física moderna, ele simboliza também a nova ordem nascida da desordem a emergência das "estruturas dissipativas». («Dicionário dos Símbolos», pp.630/631)

É isso! Não se resumindo a uma simples consoante oclusiva do alfabeto latino, eis o significado alargado do «T» na linguagem simbólica, religiosa e filosófica. Escolhido para figura de destaque e união no título deste meu livro, publicado neste ano de 2013, os astros, conjugados nos grandes e pequenos acontecimentos, ao rematar esta INTRODUÇÃO, mandam-me optar (talvez seja um desejo meu) pelo seu significado  «NOVA ORDEM NASCIDA DA DESORDEM», não esquecer o exemplo de vida dado por Mandela e, simultaneamente, estar atento às mudanças introduzidas no Vaticano pelo Papa que escolheu chamar-se Francisco, que escolheu ter o nome do frade que adoptou o «TAU» como símbolo.

Fareja, sexta-feira, treze de Dezembro de dois mil e treze, Anno Domini

O autor

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.