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quinta, 20 julho 2023 07:06

LAMELAS «PEGADAS NO TEMPO E NO ESPAÇO» (7)

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HISTÓRIA

Assumido lenhador na FLORESTA DAS LETRAS,  natural do concelho de CASTRO DAIRE, com assento no menu «Discovery & Science» de "NOTABLE PEOPLE", disponível no GOOGLE (para respeito dos estudiosos e  despeito dos imbecis),  eis-me de podão em punho a penetrar mato dentro e deixar mais algumas clareiras abertas na área do conhecimento relativo a estas PEGADAS NO TEMPO E NO ESPAÇO, de LAMELAS.

CORSO-2 - CópiaPosto o que,«mutatis mutandis», volvendo a terras de Lamelas, ao Monte da Capela Velha, à demolição do templo que ali havia em 1666, de invocação a S. Lourenço, e à sua mudança em 1700 para junto da povoação,  não andaremos longe da verdade se admitirmos que os moradores da época, fazendo jus á inteligência humana,  terão usado a mesma técnica  - o CORSO=ZORRO - e a mesma força de tração  para «arrastarem» dali as pedras da capela demolida, deixando no local apenas o topónimo que as gerações mantiveram em MEMÓRIA. E este exemplo respalda a minha afirmação feita em textos anteriores dizendo que, em certos casos, a narrativa oral tem a força de uma ESCRITURA NOTARIAL.

E o caminho existente que, no sopé do monte, atualmente quase intransitável, convenientemente, ladeia toda aquela cota em direção ao sítio onde foi levantada a nova capela, sugere isso mesmo.

Mas não sem ter ficado, para a posteridade, um «dito» (com sabor a lenda) ligado a essa mesma tarefa. Forças ocultas e invisíveis, oriundas sabe-se lá de onde, incutiam nas vacas o «tino» de se recusarem a subir o ingreme caminho que, a partir do ribeiro que separa os dois aglomerados,  levava a Lamelas de Lá, por isso da capela de S. Lourenço ficou em Lamelas de Cá. Ribeiro designado do «Valvêlho» = <<Vale Velho>> por ter origem nas linha de água que desce das encostas da Lapa, mas tem a sua verdadeira nascente já entre povoações.

Claro está que, à luz da inteligência humana, o caso não está na “escusa das vacas” subirem ribanceira acima, mas sim na opção inteligente dos moradores de então que, medindo os «prós e os contras», optaram por um caminho mais suave e acessível, por forma a serem bem-sucedidos e não castigarem os animais que eram os seus auxiliares no “ganha-pão” e tarefas quotidianas afins.

CAPELA S. LOURENÇO capela-2E foi, graças a essa opção inteligente que  a atual CAPELA DE S. LOURENÇO se levanta ali, em Lamelas de Cá, naquela terra chã. De resto, tendo ela sido transferida em 1700 e a documentação falar apenas de LAMELAS, tal como acontece nas «MEMÓRIAS PAROQUIAIS» de 1758, tudo aponta para existência de um só povoado, o «de Cá». O outro, o «de Lá» terá surgido posteriormentef. Daí as picardias que ainda hoje os moradores dos dois povoados mantém entre si, bem lembradas nos tempos da VSITA PASCAL e as dúzias de foguetes atirados ao ar em competição. Picardias que não dispensam os antigos epítetos de «mais ricos» e «mais pobres» atribuídos aos moradores das duas povoações; «mais ricos» os «de Cá», «mais pobres» os «de Lá». E com algum fundamento histórico. Os primeiros povoadores de Lamelas de Cá ocuparam, naturalmente, as terras mais chãs, mais ricas, mais produtivas. Os de Lamelas de Lá, de povoamento posterior, tiveram de contentar-se com as terras «mais pobres». E tudo isso condicionou, de certo modo, o «modus vivendi» dos habitantes. Uns mais dedicados à agricultura e outros à pastorícia, ainda que todos vivessem de uma economia agro-pastoril, até que o «comércio de feira», de que falarei mais adiante, viesse a somar-se a esse tipo de economia.

Seja como for, Lamelas continuou ligada aos povos vizinhos por caminhos e carreiros, nomeadamente aos MORTOLGOS, isto não só por exigência das tarefas quotidianas, mas também  por laços  familiares e crenças traduzidas em legados pios. Foi o caso ocorrido em 1703. Assim:

 “ Gonçalo Cardoso, de Lamelas, a 6 de abril de 1703, legou à Confraria do Santíssimo, de um quartilho de azeite de foro, para sempre, no olival dos Mortolgos e missa anual perpetua pelo rendimento da leira de Vale Velho, etc. o mesmo fazendo a  a sua mulher, Maria Rodrigues, que faleceu em 1707. (pp. 502)

IMG 7141E este foro de AZEITE deixado ao «santíssimo», por Gonçalo Cardoso de Lamelas «no olival dos Mortolgos» serve bem de respaldo à informação que, em trabalho recente, publiquei no meu site sobre aquela aldeia. Com efeito o senhor António José, natural daquela terra, disse-me que, na sua juventude, também se chamava JARDIM DAS OLIVEIRAS àquela aldeia, designação devida, certamente, à grande quantidade de oliveiras que ali existiam e cujos frutos, as azeitonas, eram transformados em azeite, na azenha de Ribas (movida à força de uma vaca), onde chegavam em cima de carros de bovinos.

E prosseguindo estes nossos trilhos de desvendar o passado com vista a esclarecer o presente e a perspetivar o futuro, eis mais algumas pepitas de ouro que encontrámos e deixamos nestas pegadas no tempo e no espaço, relativos a Lamelas:

1712 - O prelado em pessoa mandou pôr  retábulo em várias capelas, entre as quais “S. Lourenço de Lamelas”.

Se bem repararam e mantiveram em memória se lembrarão de que a Capela de S. Lourenço foi tresladada do antigo para o atual lugar em 1700. E feita a obra sabemos agora que só DOZE anos depois o RETÁBULO ali foi posto a mando do Bispo da diocese. E, por certo as obras não se ficaram por aí, pois as fotos e o vídeo que dela deixei nos meus trabalhos, mostram um templo bastante embelezado, incluindo todas as pinturas e imagens do teto. Pena que se veja ali algum desmazelo e o RETÁBULO a precisar urgentemente de RESTAURO.


RESUMINDO E CONCLUINDO

RETÁBULOEm 1666 a Capela de S. Lourenço, sita no monte onde deixou o nome, foi mandada «telhar» pelo Visitador diocesano. Em 1700 o Bispo de Lamego, D. António Vasconcelos, autorizou a sua transferência para lugar menos «ermo». E em 1712 a capela já está levantada no sítio onde se encontra e pronta a receber o RETÁBULO, que presumo ser o que ali está atualmente com as seguintes imagens da esquerda para a direita: São Martinho, a Senhora das Dores, S. Lourenço, (ao centro) e do lado direito S. Vicente.

E soma e soma e segue.

1739 - Maria Fernandes, de Lamelas, ao falecer, além de outros, deixou  a S. Lourenço, do lugar, uma belga de terra de pão, no sítio do Amieiro.

1748 - Tinha-se quebrado a Cruz de prata processional de Ester e para a consertar (no custo de 100$00), à ordem do arciprestado do distrito do Paiva, P. Bernardo Ferreira da Costa, abade de S. Pedro  de Ester, ordenou uma finta à vila de Lamelas  e dos demais povos. Concorreram para o conserto todas as confrarias.  (p.494)

mm.p.1758E DEZ anos depois, seja em 1758, os párocos de todas as PARÓQUIAS DO REINO tiveram de responder ao INQUÉRITO que D. José I, mandou fazer na pessoa do seu ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, Todos esses inquéritos são hoje conhecidos pela designação de MEMÓRIAS PAROQUIAIS. A foto que ilustra estas linhas diz respeito aos templos ali referidos pelo Pároco Encomendado Patrício Costa Peixoto. E entre eles figura a capela de S. Lourenço, em Lamelas. Eis o manuscrito:

Dentro desta vila de Castro Daire além da Igreja. Matriz tem as Capelas  seguintes  uma do Espírito Santo, administrada pelo provedor do Hospital uma de São Sebastião administrada pelo povo, mais sete  Capelas administradas por pessoas particulares das seguintes Invocações São João Baptista, Santo António, Santa Bárbara, São Salvador, Coroação de Cristo, Nossa Senhora do Desterro, e Ecce Homo; em  os lugares da freguesia tem outo Capellas do povo das Invocações seguintes - de Nossa Senhora do Presépio cita no lugar do
Mosteiro - de São Giraldo em Folgosa - de São Martinho em Farejinhas - de São Domingos no Custilhão - de São Tiago em Baltares de São João Baptista em Fareja - De São Pelágio em São Paio -de São Lourenço em Lamelas, e mais duas particulares de Nossa Senhora da Penha de França em Farejinhas, e outra de Saõ Francisco em a quinta de São Bento»

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.