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sábado, 15 julho 2023 13:49

LAMELAS «PEGADAS NO TEMPO E NO ESPAÇO» (5)

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HISTÓRIA

Assumido lenhador na FLORESTA DAS LETRAS, natural do concelho de CASTRO DAIRE, incluído no menú de "NOTABLE PEOPLE", disponível no GOOGLE,  para respeito dos estudiosos e despeito dos imbecis,, eis-me de podão em punho a penetrar mato dentro e deixar mais algumas clareiras abertas na área do conhecimento relativo a estas PEGADAS NO TEMPO E NO ESPAÇO, de LAMELAS.

SEGUNDA PARTE

Saltemos agora para 1527, tempo de D. João III e vejamos o número de moradores que havia por aqui, em redondo, para melhor aquilatarmos desta nossa realidade rural, em tempos idos. Com muito trabalho de pesquisa ransformo em grelha a informação recolhida nos vários volumes publicados por Manuel Gonçalves da Costa, um Padre Jesuíta, a quem sou devedor do pouco que sei, do muito que ele investigou e publicou, sobre a Diocese de Lamego. Investigação que deixou impressa em SEIS volumes com cerca de 600 páginas cada.

CASTRO DAIRE

92

Lamelas

29

São Joaninho

28

Farejinhas

24

Baltar do Fundo

19

Ester do Fundo

18

Folgosa

17

Crestalham Custilhão)

17

Fareja

14

Ester de Cima

14

Baltar de Cima

13

Colo de Pito

10

Codessais

11

Monteiras

10

Vila Pouca

10

Sobradinho

8

Carvalhas

8

Mosteiro

7

Relva

6

Braços

5

Vale de Matos

5

Vilar

4

Vale de Pereira

3

S. Paio

3

Carvalhosa

2

Fonte: Gonçalves de Costa, «História do Bispado e Diocese de Lamego».(vol. I-VI)

C. DE LAMEGOVista a grelha identificadora das povoações em redondo e respetivos moradores, graças à volumosa obra do Padre Jesuíta Manuel Gonçalves da Costa, investigador incansável, aquém muito devo do pouco que sei,  números que ele foi buscar ao “Numeramento” de 1527, mandado fazer por D. João III (já por mim referido em anteriores publicações), forçado sou a notar que o «NUMERAMENTO»  nos informa da existência de aglomerados populacionais constituídos, na altura, por dois povos, isto é  Ester de Cima e Ester do Fundo, Baltar de Cima e Baltar do Fundo, distinguindo S. Paio e Vila Pouca, ao mesmo tempo que refere uma só povoação  de Lamelas (presumo que seja a «de Cá») com 29 moradores e  Braços com 5.

E, sabido isso, de 1527, demos agora um salto no tempo a para o ano 1666. 

 HAGIOLÓGIOCom efeito,  no TOMO III, (edição de 1666) do “Hagiológio Lusitano”, da autoria de Jorge Cardoso,  ficou registada uma tradição oral existente na vila de Castro Daire, segundo a qual o Rei D. Dinis, teria consentido que os moradores da vila utilizassem, na construção da igreja, as pedras das muralhas do velho “crasto”. Ora, como esta igreja foi uma das beneficiárias dos FOROS surripiados à COROA, como vimos acima nas Inquirições de D. Afonso III, e sendo D. Dinis o seu sucessor, vem a calhar saber o que disse Jorge Cardoso, nesse ano de 1666, tanto mais que, a ser assim, a tradição oral teria passado de boca em boca, mais de 300 anos, sem suporte do documental, facto não despiciendo para o historiador que, neste ano de 2023,  se vê confrontado com outra “tradição oral”, esta  relativa ao sítio da antiga Capela de São Lourenço, em Lamelas, assunto que desenvolverei mais adiante, emprestando “autenticidade notarial” aos conteúdos históricos orais que, à falta de documentos escritos, eram mantidos em MEMÓRIA através dos tempos. Para já, vemos o que ficou registado no “Hagiológio”, em 1666. Assim:

No mais alto monte, em que a vila tem seu assento, estava antigamente um castelo qual dizem tomou o nome de Castro e por ser lugar alto, a todos os ventos exposto o apelido de Aire, chamando-se vulgarmente Castro d' Daire. E conta-se que passando por aqui el-rei D. Dinis lhe pediram os moradores deste castelo, para fabricarem de sua pedra uma Igreja. E dando-lhe de boa vontade fizeram a que hoje serve de Matriz , enriquecida do presente com Relíquias que nela acharam há poucos anos e com milagres de cada dia por meio do pão que nela se toca e benze a todo o tempo o qual fica isento de corrupção (...)" (1)

CAPELA S. LOURENÇOcapela-2Era o ano de 1666. A tradição posta em papel, neste ano, vinha do tempo de D. Dinis. Mais de 300 anos eram passados. E, aqui em Lamelas, há mais de 300 anos também que se fala e se conhece o sítio da Capela Velha, sem que ali de capela se vislumbre sinal ou alicerce do templo. Só o sítio e a MEMÓRIA. Acontece que «mutatis mutandis», esta realidade viva, neste ano de 2023, identificando o sítio da “capela velha” tem fundamento histórico autêntico. É que, em 1666, ano em que foi passada a escrito a tradição vinda do tempo de D. Dinis, o “visitador” diocesano, vindo de Lamego, recomendou aos moradores de Lamelas que “testelhem» a Capela de S. Lourenço. E esta capela, àquela data,  só podia ser a que deixou  lugar referido na tradição, já que, alguns anos mais tarde, exatamenteno ano de 1700, por recomendação do Bispo D. António Vasconcelos, conforme deixou escrito o «visitador», esclarecendo:

«Achando que a capela de S. Lourenço, de Lamelas se encontrava em lugar ermo, sujeito à inclemência dos tempos, com teto de forma alongada, mandou que os moradores a transferissem para lugar mais acomodado».  (Costa, G. «História do Bispado e Cidade de Lamego»)

Era o documento que faltava para respaldo e fundamento da tradição oral que chegou aos nossos dias e, com isso, valorizarmos, não só os topónimos, mas também toda e qualquer informação que possamos recolher a «viva voz» nas investigações de campo.

E, já agora, por falar em campo e produtos dele advindos como rendimento, para aquilatamos melhor as preocupações que levaram os monarcas mandarem fazer as inquirições de que acima deixamos alguns respigos, convém trazer à colação a decisão de D. Dinis, sucessor de D. Afonso III, sobre os foros que lhe eram devidos em Castro Daire. 

Com efeito, D. Dinis, catorze anos depois, ou seja, no ano de 1308  (Era de 1346), através de outro documento, lembra aos moradores de Castro Daire quais os impostos que estes lhe deviam pagar. Assim:

           D.Dinis «Dom Dinis pela graça de deus Rei de Portugal e do Algarve a quantos esta virem faço saber que como a mim o Crasto Dairo houvesse a dar em cada um ano trezentos pães e três moios de linho e dois porcos e quatro carneiros e dois cabritos, dois leitões e quinze galinhas e cinquenta ovos. E um alqueire de manteiga e um alqueire de mel e uma réstia de alhos e outra de cebolas e um almude de sal e outro de vinagre e três cargas de lenha e por cera e pimenta um maravedi por razão da minha colheita que me hão de dar João Domingos e Pero Pires, dito neto, procuradores bastante do dito concelho por poder de uma procuração bastante que eu vi e me pediram por mercê por si e pelo dito concelho que esse concelho queria dar a mim e a todos meus sucessores em cada um ano por toda as coisas sobreditas quarenta e cinco libras de dinheiro de portugue­ses velhos de vinte soldos a libra pelo primeiro dia de Maio. E eu, querendo fazer graça e mercê ao dito concelho, tenho por bem e mando que o dito concelho dê a mim e a todos meus sucessores pelo dito primeiro dia de Maio as ditas quarenta e cinco livras per rezam da sobredita colheita. E os ditos procuradores houveram por firme e estável para todo sempre por si e pelo dito concelho toda as coisas sobreditas e cada uma delas. E em testemunho disso dei ao dito concelho esta minha carta. Dada no Porto a vinte e um dias de Junho [ ...] El- Rey o mandou e fez Gil Anes seu tesoureiro e pelo Rabi maior João Domingues a fez,  era de mil e trezentos quarenta e seis anos». (15)

E, a bem do conhecimento, convém lembrar também que o nome de D. Dinis, o Lavrador, não ficou somente associado ao PINHAL DE LEIRIA, mas a tradição oral concelhia, também associa este REI POETA à MATA DO BUGALHÃO e ao SOUTO DE CASTANHEIROS sito no termo de VILA POUCA, sobre o qual já fiz amplo e elucidativo DOCUMENTÁRIO em vídeo, alojado no YOUTIBE. E, já agora, verosimilmente, ao seu cognome «Lavrador» se poderá associar o o SOUTO, ali mesmo aos pès de LAMELAS, junto à FONTE DO SOUTO, onde fui fazer dois  vídeos com a colaboração do senhor Agostinho da Silva, de Lamelas de Lá, já publicados no YOUTUBE

 

 
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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.