INTRODUÇÃO
Não há muito tempo (e digo lá, nesse texto, porquê), reconhecendo essa falha, prestei um tributo à minha companheira de vida e profissão, sua mãe, MAFALDA DE BRITO MATOS LANÇA CARVALHO (falecida em 1997) no texto e nos vídeos que publiquei no Youtube com o título “PEDAGOGIA NA ESCOLA E FORA DELA” e também no texto “A GRANDEZA DA ARTE MINIATURAL”, tudo online.
Para avivar as memórias pouco atreitas a reterem o que de afetuoso procuro deixar em letra redonda, nomeadamente, sublinhando a preocupação que tenho em “fazer história com gente dentro”, transcrevo, do primeiro texto, as palavras que se seguem:
“Guiado por um princípio que eu próprio coloquei na minha tabela de valores, sempre que me disponho a abordar factos históricos e comportamentos humanos, nomeadamente distinguir o que no mundo é “comunitariamente útil e pessoalmente proveitoso”, tenho feito eco público dos caminhos andados com enfoque nas pessoas e nomes que comigo se encontraram nas encruzilhadas da vida. De todos aqueles que, para além de legitimamente se terem decidido a “trabalhar para viver e viver para trabalhar”, foram um bocadinho além disso e partilharam com o mundo algumas centelhas da sua imaginação, criatividade e iniciativas de interesse comum. Esses trabalhos e os nomes dos seus autores, sem distinção de credos, ideologias, cores e habilitações académicas (letrados e iletrados) aí estão em muitos apontamentos que escrevi, filmei e divulguei”.
PRIMEIRA PARTE
Posto isto, sublinhada a minha postura face aos temas que abordo e referência aos nomes dos protagonistas, aproveitando o facto de, por força do CORONAVÍRUS, ficar mais tempo em casa (não esqueço que tenho 80 anos de idade e, como tal, me incluo no grupo etário que esse “amiguinho” escolheu preferencialmente como petisco, quiçá disposto a apagar-me e, sabe-se lá, a livrar-me dos trabalhos de ser eu a escolher outros meios, para me ver livre dos CUIDADOS PALIATIVOS, tão humanamente apregoados ultimamente), deu-me para prestar um TRIBUTO aos meus filhos, NURO e VALTER, «antes que o sol se ponha», diversamente daquele poema de Rodrigues Lobo, “Antes que o Sol se levante”, já por mim glosado e ilustrado em tempos, neste meu site.
Isto enquanto tiver alguma lucidez, enquanto me lembrar que uma sardinha dava para três e, com sensatez, discorrer sobre alguns registos escritos e desenhados por eles, nos primeiros anos da ESCOLA PREPARATÓRIA, nos quais, meninos ainda, refletem, seguramente, as preocupações que viam nos programas de TELEVISÃO ou captavam de outiva nas conversas que presenciavam em casa, entre pai e mãe, discordantes, seguramente, do modelo e rumo de desenvolvimento que o mundo tomou, relativamente à POLUIÇÃO E EXCESSO DE CONSUMO de bens desnecessários convertidos no lixo, na primeira oportunidade, que ia encharcando, intoxicando e enredando de forma global este nosso habitáculo de continentes, oceanos e ilhas. Era certo e sabido que num futuro próximo o ar se tornaria irrespirável, a começar pelos grandes aglomerados industriais e urbanos e que, a cada momento, gado maligno, graúdo ou miúdo, surgiria silencioso a gozar o forrobodó associado a tal ambiente.
Estávamos em 1988.
E como eu, na crónica anterior “MUNDO DOENTE” (1) não desliguei, (antes pelo contrário associei), os tempos que correm a tais fenómenos e à GLOBALIZAÇÃO, deixei claro que estava criado o “caldo” ambiental propício ao aparecimento de um qualquer estratega perito em pôr o mundo em pé de guerra, disposto a atacar em todos os campos e a ganhar todas as batalhas enquanto a CIÊNCIA não encontrasse armas capazes de o derrotar. Não foi propriamente por acaso que trouxe à colação os nomes de César, Átila, Gengiscão e Alexandre Magno. Nem foi por acaso que me lembrei dos meus tempos de trabalhador-estudante, quando um “toque de silêncio”, emitido por uma estação de rádio, punha Moçambique inteiro a dormir e hoje um “bichinho” silencioso põe todo o mundo em sentido e fechado em casa. Dá para pensar. Dá, sim senhoras e senhores.
Pois. E neste mundo cão, tal “estratega” escapulido ou não do berçário de qualquer cientista otário (ou menos otário do que sugiro) não deixa de ter, da minha parte, um certo lado simpático, que é obrigar a usar máscara aqueles que, para além de deficiências respiratórias, sofrem da crónica doença da hipocrisia, desfaçatez, falsidade e abuso do poder nas instituições em que têm assento.
O COVID19 chegou, viu e venceu. E diz a sabedoria popular que “há males que vêm por bem”, disse-o antes e repito agora. Pois que seja este um deles. Que, mau grado as vidas que já ceifou, dores que causou, rotinas que alterou, afetos que obstaculizou, tenha vindo para apurar o faro dos nossos cientistas e acabar com o forrobodó e HÁBITOS humanos (o hábito é a segunda natureza do homem) que, numa sociedade consumista e global têm delapidado a beleza e a riqueza do planeta, há muitos anos. Já o disse e aqui repito que, tal como mostraram os satélites, ele, o COVID19, fez mais pela despoluição atmosférica em pouco tempo do que todas as manifestações e berros feitos nas ruas pelos ecologistas (nos quais me incluo) e nas reuniões anuais levadas a cabo, nesta ou naquela cidade, por meia dúzia de engravatados, visando a “descarbonização” do planeta. Os efeitos estão à vista. Chegados a acordo, os países ricos compram aos mais pobres a liberdade de prosseguirem na senda da sua agenda industrial poluidora.
E mais. Diz ainda a sabedoria popular que “para grandes males, grandes remédios”.
E se nas relações sociais, em presença e/ou à distância, se interiorizou a “praxis” de famílias inteiras (de pais, filhos e netos) todos sentados à mesa dos restaurantes e cada qual a dedilhar os seus equipamentos informáticos, farejando o mundo fora desse ambiente familiar ou de amigos, nada melhor que meter toda a gente de quarentena e, juntos em casa, horas e dias seguidos, talvez se volte às antigas “conversas de família” e, quiçá, os afetos de sangue se venham a sobrepor aos afetos tecnológicos.
Nem de propósito. No momento em que escrevo este apontamento a minha EQUIPA DO FACEBOOK, traz-me ao CAPÍTULO DAS MEMÓRIAS um vídeo que PARTILHEI no meu mural do qual captei os fotogramas que ilustram o que acabo de dizer. Preto no branco, as palavras e a angústia daquela criança na sua escola, deixa muda a sua professora e sensibiliza o coração mais empedernido. E mais ainda. Até parece que os distúrbios e mortes de jovens à saída das discotecas às tantas da matina, deixaram de ser notícia e, vejam só, até as notícias da «violência doméstica». As estatísticas, os estudos e o mapeamento dos campos de batalha, serão esclarecedores disto tudo, lá mais para diante. Até lá aguardemos Waterloo.
O COVID19 chegou, viu e venceu. Até ver. Disposto a engolir a “malta grisalha” que sobrecarrega os orçamentos do estado por força da ciência lhe prolongar a vida, há que desbastar. No campo, o lavrador serrano, chamava a isso “o arralento”. Para melhorar a colheita é preciso espaço entre pés de feijoeiros e graeiros semeados a mão solta.
Pois. Neste caso, muitos elementos juntos, é o campo propício para a fera travar a batalha e ter vitória segura. Estratega de sua natureza ou saído do berçário de cientista otário, ou também estratega, neste mundo globalizado não falta ângulo e lado, triângulo, pentágono ou quadrado, onde se não façam encontros de moda, feira ou mercado. Esse é o ponto. Juntos aos molhos. À maneira de como se fazia na antiga mercancia, cada negociante, sem bestas de carga, está munido de alforges naturais capazes de neles transportarem sem saber o “bichinho” que faz pela sua vida, roubando vidas. Besta e almocreve são uma e mesma coisa.
É conhecida a minha aversão aos grandes meios urbanos. Deslizando no chão, por viadutos, ruas e aquedutos, chamo a tal população “formigueiros humanos”. Vivendo em prédios altos lotados da base ao topo, chamo-lhe “colmeias sociais” que, ao contrário das abelhas, tarefas comuns, atentas sentinelas, avisam todo perigo externo. Sempre unidas e comunicativas, os humanos, ao contrário, descem e sobem elevadores, os mais deles sem se conhecerem, de onde vêm, quem são e para onde vão.
Defensor da REGIONALIZAÇÃO, denunciando sistematicamente as causas da DESERTIFICAÇÃO de grande parte do país, tenho pugnado por uma visão política e administrativa do território mais consentânea com o seu desenvolvimento equilibrado, cometendo a aleivosia de ter escrito, há um bom par de anos, que o “futuro está no campo”. E parece que foi preciso chegar um senhor TODO PODEROSO (mesmo que só visto ao microscópio) para se ver que o “maligno”, qual estratego de guerra total, soube escolher os meios mais fáceis e seguros para a sua disseminação, com vista a fazer o maior número de vítimas, antes da CIÊNCIA se apetrechar das armas capazes da sua eliminação.
Os meus dois filhos, na sua ingenuidade infantil dos primeiros anos de escolaridade, deixaram prova escrita denunciadora da POLUIÇÃO e dos males dela resultantes para os seres vivos, incluindo o ser humano. Ambos deram aos pais o orgulho de verem reconhecidos, publicamente, os trabalhos que, na sua infantilidade, foram capazes de imaginar e de escrever a pedido ou sugestão dos seus professores, de então.
E, ao ser-lhes reconhecido o mérito da escrita e do assunto versado pelas instituições intervenientes, não faltou quem suspeitasse haver ali “mãozinha” do pai ou mãe, ambos docentes com trabalhos publicados na imprensa. Enganavam-se redondamente. A pedagogia doméstica praticada por este casal de professores - Abílio e Mafalda - era dar aos seus educandos, inclusive os filhos, conhecimentos e ferramentas de trabalho que lhes proporcionassem estar atentos ao mundo, a libertar a imaginação criadora, desenvolver a inteligência e pôr em prática a aprendizagem transmitida e adquirida pelos seus próprios meios e vivências, sempre guiados pelo binómio LIBERDADE E RESPONSABILIDADE. Sem cunhas, empenhos ou quejandos. Assim em pequenos. Assim em jovens. Assim em adultos. Assim, filhos que eram. Assim pais que são. Um estímulo sério e aprumado que o avô deixa por escrito às duas netas, Mafalda e Marta e ao neto Guilherme, “ antes que o sol se ponha”.
SEGUNDA PARTE
O Nuro viu um dos seus textos publicado na coleção “UMA AVENTURA” da Editora Caminho, ganhou uma bicicleta e o Valter, ganhou o computador que é hoje uma relíquia, mais um fim de semana no Parque Natural da Serra da Estrela.
Há dias, rematei a minha crónica “MUNDO DOENTE (1)”, lembrando “A LENDA DO PLANETA TERRA” concebida e escrita pelo Valter. O caso era que a vida na TERRA tinha colapsado totalmente e a história da existência deste planeta tinha assumido a forma de LENDA contada numa escola de outro planeta que, na sua trajetória cósmica, se mantinha vivo no imenso universo. Vejamos isso nas palavras do infantil autor:
«(...)
Eu ia para a Escola Preparatória desse planeta desconhecido de ar puro e saudável. Na aula a professora disse:
- Abram o caderno diário e ponham a data, quero contar-vos uma lenda.
Um dos alunos perguntou:
- Que dia é hoje?
A Professora respondeu:
- Cinco do Arpuresco de 4999. Era do Ambiente.
E a professora começou assim a lenda.
Era uma vez um planeta chamado Terra. Era belo e lindo. Tinha montanhas e vales, planícies e planaltos verdes, muitos animais de muitas raças, desde o mosquito ao dinossauro (...)
(…)
(Fareja, 8 de janeiro de 1988)»
Pois. Para saberem mais, caros amigos, estudem a maneira de ler o texto completo cujo arranjo gráfico aqui deixo, com muito orgulho e felicidade.
O mesmo para com o meu filho Nuro. É mais velho um ano do que o Valter e se apareceu aqui em segundo lugar, isso se deveu somente ao modo mais fácil de organizar a estrutura que dei a este apontamento, condicionado que foi pela alusão que fiz a LENDA DO PLANETA TERRA, em crónica anterior.
Dito isto, direi que a POLUIÇÃO também não escapou os olhos e sensibilidade do Nuro. Recentemente, para surpresa sua e minha, encontrei um texto dactilografado que lhe remeti de imediato.
Direi, em discurso indireto, por comodismo da narrativa, que passando ele perto de uma oficina nos arredores da aldeia «onde moro» (sic), dado o estado calamitoso que lhe feriu a vista e sensibilidade, engendrou um diálogo muito animado entre a bicharada que julgou existir ali. E nesse diálogo meteu minhocas, caracóis, abelhas, pássaros, lagartas e o grilo “consciência do Pinóquio”.
Depois de uma longa conversa, com uso da onomatopeia e tudo, a bicharada resolveu, em conjunto, limpar a zona. Foi um ver se te avias. Uma surpresa agradável para as flores e as plantas quando acordaram, no dia seguinte. Ficaram por ali umas manchas de óleo, mas isso ficava por conta das chuvas. E assim foi. Chegou a chuva. E chegou a Primavera e o ciclo da vida renovado. E, numa perspetival oposta à do irmão, que viu a terra morta volver lenda, ele termina com uma chave de ouro esperançosa: “natureza venceu o homem”. (Fareja, 4 de Janeiro de 1988).
Mas o melhor é ler o texto completo por ele escrito, que figura pegado à fotografia que ilustrou “UMA AVENTURA” publicada na Caminho.
CONCLUSÃO
A presente crónica, ilustrada com os textos que ambos produziram, depois de sujeitos ao arranjo gráfico que lhe dei para melhor acomodação neste meu espaço online, juntamente com desenhos seus que por cá ficaram, vieram mesmo a calhar nos tempos que correm.
Ambos, naquela sua idade de inocência, abordaram as más condições de vida na TERRA. Ambos sublinharam as preocupações da bicharada terrestre e o papel egoísta e predador do ser humano contra a natureza. E eu, sem eles esperarem, os surpreendo a ambos com este meu tributo, sublinhando os seus diferentes pontos de vista, personalidade e carater, apesar de a ambos ser administrada a mesma educação e aprendizagem:
a) O Nuro deixou claro que a “natureza vence o homem” .
b) O Valter. diferentemente, viu a Terra, despovoada, morta, e volver lenda contada noutro planeta.
Ambos seguiram as suas vocações académicas e tiraram os seus cursos superiores sem cunhas, nem empenhos. E aqueles que duvidaram de serem seus (só seus) os trabalhos cujo MÉRITO lhes foi reconhecido publicamente aos 10 e 11 anos de idade, trabalhos que ilustram este TRIBUTO, façam o favor de navegar no mare magnum do GOOGLE e do YOUTUBE, pois nas suas ondas encontrarão, por certo, dois surfistas, com prole a seu cargo, de que muito me orgulho de serem os pais das minhas netas e neto.