Encontrou essa peça nos escombros de uma obra em reconstrução e, mal a viu, logo a minha pessoa e os meus interesses pelos descartáveis e “descartados” artefactos históricos lhe acorreram à mente. Guardou-a e, na primeira oportunidade, abriu a porta da carrinha e surpreendeu-me dizendo:
- Tenho aqui uma coisa para si. Ela inclui-se nos trabalhos de estudo e preservação que anda a fazer.
E vai daí, passou-me para a mão a RELÍQUIA que aqui deixo retratada e da qual já fiz vídeo, cujo link anexo em rodapé. Claro que me deu algum trabalho para estar assim apresentável. Foi desmontada, desoxidada, montada novamente e polvilhada com verniz incolor por forma a evitar oxidação imediata.
Trata-se de um mini-fogão “SOMETAL” inventado para funcionar com álcool. De pequenas dimensões, num dos extremos tem um proporcional e artístico depósito em latão, que, por tubagem do mesmo material instalada sob a estrutura de suporte, se liga a uma boca circular de vários furos (tipo fogão de cozinha) com registo de parafuso para regular o volume da chama, resultante do álcool que, servido em estado líquido, por técnica básica de aquecimento, ali chega vaporizado em estado gasoso.
Até ver, é peça única do gênero, cá em casa. E grato estou ao meu amigo António Matias, pela oferta. Mas, para além disso, o que muito me satisfaz é o facto de toda a sensibilização que tenho andado a fazer, em vídeo e em texto, apelando à descoberta e preservação do nosso património histórico, material e imaterial, não tem caído em saco roto. O caminho faz-se caminhando.
Esta peça, ultrapassada que foi a sua função, descartada que foi por inútil, salvou-se por um tris de ir parar ao ATERRO DO PLANALTO BEIRÃO. Caiu sob os olhos de um cidadão sensível à preservação do património e ele a encaminhou para destino diferente: para minha casa. Esse seu gesto, ao fazê-la chegar até mim, retardou, por alguns anos, a sua morte anónima e inglória, volvendo, assim, uma página aberta da nossa “história, indústria, técnica e cultura”, pronta a ser lida e a glorificar a inteligência humana, pois as coisas - as mais simples e as mais complexas e elaboradas - mais não são que a nossa “extensão humana”.
Recuperada e encavalitada num fogão de cozinha, seu descendente em uso, ela a aí está pronta a entrar no INVENTÁRIO DE PARTILHAS da “legítima” que vou deixar aos meus filhos e netos. Ciente, porém, de que nenhum deles (por força de viverem noutros tempos e terem outras vivências, outros objetos de entretenimento e serventia) jamais saberão «o apreço, o custo e o preço da legítima deixada».
VEJA O VÍDEO: https://youtu.be/ULLI8BK_mUU