Trilhos Serranos

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quinta, 12 dezembro 2019 10:12

CONTO DE NATAL (2)

Escrito por 

AGRADECIMENTO

Um acaso de vida proporcionou-me o encontro, em Castro Daire, no Jardim Público, junto da MÁQUINA A VAPOR, com o senhor NUNO LOPES VIEIRA e sua esposa, dos lados se Santarém, mas a residirem em Oeiras.

Indo eu a passar e vendo-o, muito atento a mirar e a fotografar aquela peça arqueológica, ali colocada por sugestão minha, cuja história (completa) está chapada no livro “Castro Daire, Indústria, Técncia e Cultura” (história resumida que o Municípino bem podia oferecer num desbobrável, que imperdoavel,ente nunca fez) aproximei-me, entabulámos conversa e ele ficou tão agradado com isso que passou a ser meu ”amigo” no Facebook e a corresponder-se comigo, via MESSENGER.

É dele o CONTO DE NATAL que se segue. Esta minha página não está aberta a toda gente. Mas tendo eu já lido, por força da profissão, muitos contos de NATAL, este veio mesmo a calhar. Vale pelo comteúdo e pela forma. Ora leiam:


“CONTO DE NATAL 

Com um cruzado no bolso e um ovo cozido no saco de pano, o que havia a fazer longe de casa e da família? — Questionava-se o jovem casal, perante o infortúnio em que se encontrava e o levara à cidade distante.

Caminhando sem sentido, a não ser o de mitigar a preocupação e a falta de sorte que os levara a ter de esperar pelo transporte que mais tarde os levaria para junto dos seus filhos, ou, já resignados, a caminhar a pé a longa distância que os separava de casa, se os assuntos inadiáveis que os levou à cidade, não se resolvessem a tempo. Depararam-se com aquela vetusta igreja em rua estreita que, descendo poucos degraus, os convidava a entrar.


alporão -redzNunca lá tinham entrado e, desta vez, bem podiam satisfazer a curiosidade de a conhecer, funcionando a visita, também, como uma boa ajuda para esquecer o tormento por que passavam.

Uma vez lá dentro, foram abordados por um velho e prestável senhor que se prontificou a contar-lhes a história daquela antiga igreja. 

Agora, mais descontraídos, seguiam, deslumbrados, as explicações do ancião que, entusiasmado pela inesperada audiência, declamava a história e lhes prendia cada vez mais a atenção.

Depois de tão vasta e profunda explicação havia que compensar  o tão prestimoso senhor.

Num gesto incontrolável de imensa gratidão e respeito, porque a situação assim lhes parecia correcta, deram-lhe os quatro tostões que tinham no bolso.

Entreolhando-se e em sintonia de pensamento, acharam que o valor era insuficiente para pagar a única consideração que receberam de alguém naquele dia, numa cidade que os habituara, ao longo dos tempos, a tratamento sobranceiro.

— E que mais podiam oferecer ao senhor?

— O ovo...?

— Pois claro, o ovo cozido...!

Sem demora, abriram o saco e de lá retiraram o ovo caseiro, que essa qualidade a sua cor bem atestava, e lho ofereceram.

Agora, sem cruzado no bolso; sem ovo, que era o seu sustento; e com quilómetros de caminho por percorrer, iniciavam a marcha, sem qualquer problema.

Na cidade grande, haviam oferecido tudo o que lhes restava e estavam contentes... o seu cruzado e o ovo trazido de casa, fariam a diferença nessa noite na mesa daquele ancião...”


P.S. Homenagem a um casal bom, meus pais, protagonistas da história contada.

Igreja São João Alporão, Santarém 
Anos 40, Séc XX
Cruzado = 2 tostões = 0,20 escudo

Nuno Vieira

11Dez2019

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.