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quinta, 13 março 2014 12:25

TRIBUNAL DE CASTRO DAIRE (5)

Escrito por 
DA FICÇÃO À REALIDADE

PARA UMA MELHOR JUSTIÇA (5)

 3.8 - EXPLIQUEMOS:

Em 26/9/1986, por escritura pública outorgada no Cartório Notarial de Castro Daire, adquiri o prédio urbano com logradouro e quintal anexos, sito no lugar de Fareja, em cujo documento oficial ficou declarado que a aquisição do prédio incorporava «uma passagem de pé e carro, através de uma eira anexa a este prédio pertencente, à data, a Nazaré Cardoso, e também uma servidão de aqueduto sobre a mesma eira para condução de água do povo vinda de Vila Pouca e que se destina à irrigação do quintal anexo a esta mesma casa».

.Aconteceu que, tendo eu feito uso, desde então e ininterruptamente, desses direitos, incluindo as pessoas que me tratavam e cultivavam parte do quintal, em Maio de 2010, o vizinho do lado, herdeiro que foi, por casamento, de parte da «eira» da dita Nazaré Cardoso (que em tribunal, como veremos mais tarde, não fez prova de ser dele) entendeu obstruir-me a passagem de «pé, carro, tractor e animais», impedindo  o senhor Fernando Pereira de Carvalho de entrar no meu quintal pela via habitual, para tirar o feno que havia segado, com a minha autorização. E fez esse impedimento com uma sugestiva ameaça: «quem passar aqui sem a minha autorização, cai». Expressão que foi levada aos autos, por escrito do meu advogado mandatário, e confirmada em audiência por duas testemunhas, ouvida, alto e bom som, por quem lá estava.

Face aos factos ocorridos e levando eu a sério a ameaça feita, professor que passei anos a educar para a cidadania e para o comportamento cívico devido e exigido a cada cidadão educado, ainda tentei demover o «agressor verbal» dos propósitos, através da GNR, a quem comuniquei o caso. A Corporação fez deslocar um agente à sua morada, sem  contudo o demover dos seus intentos. Face a isso, em defesa dos meus direitos, não me restou outra alternativa senão o recurso ao tribunal. Tanto mais que bem inusitada e extemporânea era aquela atitude «ab irato» e repentina, pois desde que me tornei proprietário da moradia, jamais fui impedido de por ali passar a pé, de carro, tractor, animais e uso da água para rega., por quem quer que fosse.

4 -  – TRIBUNAL JUDICIAL DE CASTRO DAIRE

4.1 – ACÇÃO

Para não correr o risco contido na ameaça, entreguei o caso ao meu advogado, Dr. Aurélio Loureiro, com escritório aberto em Castro Daire, licenciado de toga pré-Bolonha, a quem eu já tinha recorrido algumas vezes para me PREFACIAR alguns dos  livros por mim publicados e, até, corrigir as «provas tipográficas».

Ele, depois de se inteirar dos factos por mim relatados, depois de estudar a documentação fornecida, quer escrita, quer fotográfica, quer em vídeo, depois de uma visita «in loco» para se certificar da razão que me assistia e da verdade que eu alegava, organizou toda documentação no formato e nos termos jurídicos em uso, pondo no Tribunal Judicial de Castro Daire, a ACÇÃO nos resumidos termos:

«Abílio Pereira de Carvalho, viúvo,  residente no Largo de S. João, nº 9 em Fareja, Castro Daire, (…) vem propor e fazer seguir contra António Manuel Lourenço Almeida e mulher Ana Paula de Jesus Correia Almeida, residentes no Largo S. João, nº 11 em Fareja, Castro Daire, a acção declarativa com processo sumário, nos termos e com os seguintes fundamentos».Tribunal-2

E assim se iniciou a acção que serviu de base ao PROCESSO JUDICIAL que recebeu o número 252/108TBCDR. Dos fundamentos cima aludidos, distribuídos por substancial articulado, respaldado em jurisprudência e documentação anexa q.b. destaco os seguintes itens:

6 -  Desde o final das obras, 1986, que o A. Abílio, mulher e filhos passaram a habitar aquela casa, nela dormindo, tomando as refeições, etc.

 7- Do mesmo modo, desde o final das obras, passaram também o A. Abílio, família e outros com sua autorização, a tratarem do logradouro e a cultivarem o quintal anexos à casa, nele plantando árvores, nele semeando e plantando diversos produtos, desde hortícolas, a batatas, milho, abóboras, etc.

 8- Tudo isso fazendo, quer por si mesmo, quer através de terceiras pessoas a quem autorizaram a cultivarem o quintal de forma gratuita.

 9- Tudo isso fazendo à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, convictos de estarem a exercer um direito próprio, adquirido por compra e através de escritura pública e sem ser em prejuízo de outrem. Assim sendo, à falta de qualquer outro título formal de aquisição, acresce também que, por usucapião já teriam os AA. adquirido o dito prédio, aquisição essa que se invoca para os devidos efeitos legais.

(...)
 18- Eira essa que para além de servir de lugar comum de malha de cereais, feijões e outros produtos, guarda de espigas no espigueiro / canastro que ainda lá se encontra, servia também de passagem permanente de pé e carro para o prédio dos AA, assim como local de passagem, e por onde continua a passar um rego de transporte da água vinda de Vila Pouca para regar os campos de Fareja, designadamente o quintal da casa dos AA. e por onde os respectivos proprietários e ou terceiros autorizados pelos AA a cultivarem o quintal anexo, passavam também para acompanhar essa mesma água até ao seu prédio e dele retirarem os produtos cultivado»

 Após o que, e como é uso há séculos, formulou sumariamente o devido pedido, cujas alíneas aqui se reproduzem na integra, pois a elas voltaremos aquando abordarmos a sentença proferida pela Meritíssima Juíza de Círculo Judicial de Lamego, Maria de Fátima Cardoso Bernardes, onde ela discorreu e opinou sobre matéria não pedida. Assim e somente, é o pedido:

«Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e em consequência:

a) Devem os RR. ser condenados a reconhecer o direito de propriedade de acesso dos AA. sobre o prédio urbano e quintal anexo, artigo matricial 3366, melhor identificado em 1, 4  e  5 deste articulado.

b) Mais devem os RR. ser condenados a reconhecer o direito de servidão de passagem de pé, animais e carro (incluindo tractor) em favor do prédio dos AA, para acesso às entradas das traseiras do prédio e  parte rústica do mesmo constituída pelo logradouro e quintal, a exercer diariamente e a qualquer hora, como sempre aconteceu.

c) Devem ainda os RR. ser condenados a não mais obstruir ou por qualquer meio impedir ou dificultar os referidos direitos de passagem em favor do prédio dos AA.

d) Assim como devem ainda os RR. ser condenados na sanção pecuniária compulsória de 500,00 €  por cada vez que obstruam, impeçam ou dificultem o exercício do direito de passagem que vier a ser reconhecido em favor do prédio dos AA, seja de pé, carro, ou com animais».


Junta: 3 procurações que, para efeitos deste processo, me foram conferidas pelos AA… documentos, DUC e doc. de pagamento da taxa de justiça».

 

(continua)

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.