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terça, 11 março 2014 12:37

TRIBUNAL DE CASTRO DAIRE (3)

Escrito por 
DA FICÇÃO À REALIDADE

PARA UMA MELHOR JUSTIÇA (3)

3 - Os autos seguem os seus trâmites, mas paremos um bocadinho a reflectir no texto deste Meritíssimo Juiz. Ele diz «ignorar a querela» a que alude o Ministério Público, e isso não nos parece plausível, nos tempos que então se viviam. Num meio pequeno como era Castro Daire e dado o alarido público do crime que levou à morte do Arcipreste, como podia o Juiz ignorar tal querela? E o facto de constantemente se arrolarem novas testemunhas ao processo faz presumir que havia a intenção clara de o arrastar indefinidamente, situação a que não seria alheia influência dos brasonados João e José de Melo, a desempenharem altos cargos na governança, desde 1820. (assunto que trato no meu livro inédito «Castro Daire, Clero, Nobreza e Povo»)

Tribunal-2De facto os miguelistas que pontificavam aqui, em Castro Daire, eram José de Melo, natural de Farejinhas, a manejar os cordelinhos em Lamego, onde fora colocado, então, e o seu primo João de Melo Sampaio Almeida Albuquerque, capitão-mor de Castro Daire que, nos fins de Novembro de 1823, contam com os prestimosos serviços do Padre Domingos José de Araújo, que se deslocou aquela cidade para «receber instruções quanto ao levantamento do concelho de Castro Daire a favor de D. Miguel». Prestação de serviço que valerá ao capitão-mor, primeiro, a sua nomeação para «Comandante Geral das Ordenanças da Comarca de Lamego» e, depois, «Comandante Geral das Ordenanças da Beira Alta». (cf. COSTA, M. Gonçalves da «Lutas Liberais e Miguelistas», Lamego, 1975)

Seja como for, todos os meliantes acabaram por ser condenados, ainda que dois deles, a tempo e horas, se tenham posto na alheta. A mesma sorte não teve José Ferreira, pois assim o diz a sentença proferida em 31 de Maio de 1844, quatro anos e alguns dias depois de perpetrado o crime. Assim: 

Setença-1844«Em 31 de Maio de 1844, foi este réu em audiência geral por sentença do mesmo dia, condenando à morte em huma forca, que será levantada na Praça desta vila e depois de morto lhe serem cortadas as mãos e colocadas em um poste no lugar de Farejinhas, conservando-se assim expostas ao público por seis meses».

 3-1 - Demorei-me um bocadinho mais na descrição deste crime de morte, ocorrido em 1840, em Castro Daire, por duas razões. Primeira: mostrar a relação que, tal como hoje, existia, no âmbito da Justiça, entre Castro Daire e Lamego.Segundo: mostrar que, em meados do século XIX, um crime de morte levou 4 anos a resolver, tantos quantos, no princípio do século XXI, levou a resolver uma simples «servidão/reconvenção».

3.2 – E, por virtude desta matéria entrar na causa a que acima aludi, o mesmo vou fazer com a «Demanda» relativa à «Levada de Fareja», sobre aqual me debruceinos anos 80 do século XX, no jornal «Lamego Hoje» e foi tema da palestra que, em 1995, fiz na «Casa da Beira Alta» no Porto, assunto que Raul Dias levou às colunas do «Jornal de Notícias», de 3 de Agosto. Assim: 

 «Lá foi também o Dr. Abílio Pereira de Carvalho e, com a autoridade que lhe é reconhecida pela demonstrada capacidade de investigador, colunista e escritor, dissertou, obviamente sobre a história de Castro Daire. Estabeleceu a dicotomia passado/presente, pondo hábil ênfase nas questões da água, enquanto questões de sempre: a água pela qual se matava à sacholada, a água fonte de energia, (moinhos, azenhas, pisões etc.), a água que hoje suscita delicadas questões internacionais, a água com que os ímpios tecnocratas querem afogar a própria História, a água que, sintomaticamente, o Porto vai beber das nascentes cristalinas da vertente sudeste do Montemuro». (in «Jornal de Notícias", Ano 108, nº 63 de 03.08.95)

(continua)

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.