Dei conhecimento desse nosso encontro no meu mural do FACEBOOK, sem mais comentários, ciente de que, no vídeo, estava tudo dito. Mas, repensando a minha atitude, aqui estou em linha, pois, se me ficasse por aí, seria muito injusto para com este meu amigo AQUILINIANO ENCARTADO, ele que, tardiamente, me incluiu no seu rol de amigos. E fê-lo tão só porque, navegando no “espaço sideral” da Internet, esbarrou no meteorito “TRILHOS SERRANOS” e nele se inteirou que eu era BEIRÃO, que pisava os terrenos que o MESTRE havia pisado e lidava com as gentes, com o povo, que ele, AQUILINO, dizia “labrostes” a servirem-lhe de “matéria plástica” para as suas obras, ainda que esse povo, essa gente o não lesse, tal era o grau de analfabetismo e gosto nenhum pela leitura, no seu tempo. E agora?
O Dr. Lima Bastos, nesta nossa curta conversa ao vivo, olhos brilhantes, ora fixos na objetiva da câmara, ora furtivos a ela, deixou aqui, prontas a serem lidas pelo mundo inteiro (atento), muitas páginas de humanidade, sem formato, sem volume, sem peso, nem medida.
Com nítidos afloramentos de vontade, força e humor, aqui e ali, não escondeu a fragilidade da pessoa que, chegada aos 85 anos de idade, confessa e reconhece quão gratificante e penosa é, simultaneamente, a “ARTE LITERÁRIA”. Qual druida que, no caldeirão das LETRAS, procura a poção mágica da valentia e da invencibilidade (sei lá se a da imortalidade alquímica) ele mexe, remexe e, respirando os vapores da caldeirada, vê “claramente visto” o reconhecimento e a glória do seu labor, ao mesmo tempo que se dá conta da perda dos convívios de amigos e de família que não houve, convívios que não teve e jamais poderá ter e recuperar. O tempo passou. E, sabendo-me também “podador” na FLORESTA DAS LETRAS, remeteu para mim, para a minha experiência, os custos e os ganhos sociais da nossa maneira de arrastar os tamancos ou romper as solas dos sapatos nos trilhos que pisamos vida fora. Ambos assumidos garimpeiros e colecionadores das pepitas de ouro que recolhemos nas águas dos rios que formam a rede hidrográfica em que nos banhamos, quando tais palavras saíam da sua boca deu-se uma espécie de transmutação. Ele era um espelho e a minha imagem, de carne e osso, nele se refletia, com as mesmas glórias e as mesmas “dores de alma”, as mesmas angústias trazidas pela solidão eremita adotada ou pela solidão autoimposta por dever de ofício e amor ao múnus que abraçamos.

Rapaz de minha idade, cidadão de “compromissos” (advogado que foi de profissão) atacado, naturalmente, pelas maleitas dos anos, não deixou que a “gota” o impossibilitasse de cumprir a palavra dada e, recorrendo a fármacos adequados (nem sempre aconselhados) aí o temos a rodar centenas de quilómetros por autoestradas e estradas secundárias no carro e companhia do seu inseparável amigo, Engenheiro António A. Ferreira, a fim de expor eloquentemente (com graça e saber) as suas experiências de vida, de família e a mostrar os elos afetivos que, apesar de tudo, conseguiu manter e projetar nos SETE rebentos que o tratam por AVÔ.
Sabedor que sou (por ver e constatar diariamente) que a nossa juventude («a mais qualificada de sempre», dizem) caleja a polpa dos dedos polegares a fazer deslizar a tapete dos seus equipamentos de comunicação, Smartphones e similares, à laia de provocação amiga, procurei saber se ele não se sentia o “ÚLTIMO DOS MOICANOS” em defesa dos tradicionais valores literários e esperançado que essa juventude viesse algum dia a ler o MESTRE, diretamente ou através dele.
Advogado que foi, com traquejo adquirido na barra dos tribunais grande parte da sua vida, deu-me uma resposta sintética, inteligente e afetiva. Trouxe Óscar Lopes, Batista Bastos e outros HOMENS de LETRAS à colação, fazendo seus os conceitos que eles tinham da obra do MESTRE, a sua ligação intelectual e afetiva a essa obra, e que, nessa acessão, ele bem poderia ser o último dos MOICANOS.
Pois é. Eu creio mesmo que é. E “com pena” lho disse na introdução da pergunta. É que eu não estou a ver essa nossa “juventude mais qualificada de sempre” a carpinteirar um ATRIL para nele assentar inclinado um volume de 1.462 páginas e, cómoda e pacientemente, joeirar cada uma delas deliciando-se com as preciosidades literárias que ele arrancou da obra do MESTRE e as que ele, de sua lavra, semeou em tão extensa e fértil herdade.
Direi melhor, para não fugir à atmosfera aquiliniana. Não estou a ver essa mesma «juventude mais qualificada de sempre» a prantar-se à frente de um AMBÃO e a folhear aquele volumoso MISSAL, pois, mesmo que escrito, a pedido do autor, segundo as regras do velho ACORDO ORTOGRÁFICO (por discordar daquele que está em vigor), tudo para eles é LATIM, com ou sem as VERMELHAS LETRAS CAPITULARES góticas e apelativas.
E tudo isto, a meu ver, patenteia no campo dos meus pensamentos e afetos a luta de dois gladiadores no circo romano: o REGOZIJO de ver publicada uma obra assim e o DESALENTO de a ver remetida à prateleira de uma qualquer BIBLIOTECA, sem ser lida.
São as marcas dos tempos que correm. E a minha mulher Mafalda, colega que foi de estudo e de profissão, se estivesse viva, diria no seu sotaque alentejano: «que «trabalhêra!». Ela que não ferrava dente no Aquilino, mas que degustava Eça, Garret, Camilo, Alves Redol, Fernando Namora, Manuel da Fonseca, Lobo Antunes, Saramago, Zola e até engoliu por inteiro a «Guerra e Paz» de Leão Toltoi, coisa que eu nunca fiz. Ela que, tão apropriadamente e nos momentos certos lembrava «A Insustentável Leveza do Ser» de Milan Kundera.
Bem. O melhor é ver e ouvir a ENTREVISTA, sem mais comentários. Basta, para tanto, clicar no link que se segue.
https://youtu.be/X7zGF7JShD8?si=cSnxpQKMG7O9XlXk