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quarta, 27 março 2024 14:19

CINQUENTA ANOS APÓS O 25 DE ABRIL

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CINQUENTA  ANOS  APÓS O 25 DE ABRIL

No país anda tudo em alvoroço. Aproxima-se a EFEMÉRIDE da «Revolução dos Cravos» e eu, que já escrevi bastante sobre esse dia da LIBERDADE, que no meu último texto colocado no mural do FACEBOOK transcrevi e ilustrei a «inauguração» do «Clube Republicano» tratado por Eça de Queirós no seu livro «A CAPITAL», onde aparece um protagonista de nome ABÍLIO a oferecer um busto de MINERVA para decoração das paredes do CLUB,  mais uma vez recorro a quem melhor diz e sabe sobre as «conquistas das liberdade» e o uso que delas se faz.

1-REPUBLICA0000

Desta vez, socorro-me do recorte do jornal «REPÚBLICA» encontrado no «dossiê» político que foi pertença de EDUARDO PINTO DE CARVALHO,  reconhecido comerciante com porta aberta na vila de Castro Daire, cedido pelo seu filho médico com o mesmo nome, que residiu e exerceu a profissão nas Canárias, recentemente falecido.

A esse «dossiê» voltarei para revelar, por escrito, o seu papel de «ação política» logo após o 25 de abril.

Desta vez, e como substrato de um pensamento republicano consolidado em leituras e vivências, aqui fica parte do texto digitalizado a que acima referi, da autoria do Dr. Rodrigo Rodrigues. Pena foi não ter sido datado, ainda que o autor nele diga ter «descido a Lisboa no ano de 1957». Assim:

 

«(…)

2- REPUBLICAPrimeiro foram as riquezas fabulosas dos descobrimentos — África, Índia e terras do Oriente. Riquezas colossais. Tudo que entrou, saiu para outras terras:

 Flandres, Holanda, Veneza, Inglater­ra, a troco de sedas, veludos, armas, ren­das, pratas, futilidades, sem deixar rasto valioso, sem o menor emprego útil ou produtivo. A nação continuou pobre e até com menos do seu verdadeiro valor a gente. Diminuída, desvalorizada e corrompida!

De tudo o que ficou, o que resta? Dois ou três monumentos vistosos, várias igrejas ostentosas, falando, eternamente da nossa vaidade estrutural. Uma embai­xada ao Papa, que espantou a Europa, pela sua ostentação — tafularia — e uma corrupção que acabou por vender Portugal à Espanha!

Exausta essa chuva de mal empregada riqueza, outra voltou — a dos «quintos dos Brasil». Barcos e barcos transpor­tando — ouro, pedrarias, açúcar, escra­vos e móveis de luxo para Lisboa.

Reincidiu-se pela mesma estúpida bazófia, nos mesmos erros. O que resta de tudo?

O «aborto» de Mafra, os arrebiques da Estrela, o cubo quezilento de S. Roque, a mesma ignorância, laivada com os re­vérberos ferozes das fogueiras da Inqui­sição, dinheiro, imenso dinheiro dado para comprar honrarias fúteis aos car- diais em Roma, pano para nos vestir na Inglaterra e comida por esse mundo...

3-REPUBLICAComo elucidação, valha-me aqui, em­bora muito longe ainda de toda a verda­de, o testemunho, há dias publicado no «Diário de Notícias» pelo meu ilustre amigo e professor, sr. dr. A. Marques Guedes. Diz ele, fazendo análise proficiente ao que foi, ao que tem sido este desvario:

Nas antigas gravuras, sempre que se queria pintar um Português, desenhava- -se um indivíduo de espada e plumas, co­berto com um sombreiro, seguro por um mordomo, ladeado de escravos.

Tudo faminto e fanfarrão.

Ofende? Não o penso. Outros têm pior; mas sou da opinião que só se cura o mal que se conhece, embora seja para isso preciso descobri-lo e exagerá-lo até.

Mas tanto ou mais que isso no-lo disse já em 1426 o Infante D. Pedro, filho de D. João I, o maior da «ínclita geração de altos infantes».

 Não há, na História Portuguesa, figu­ra mais perfeita. Culto, sábio, prudente, patriota, e, por isso, infeliz, intrigado pe­los Braganças, atraiçoado, assassinado e escarnecido. Dele conta O. Martins, no seu magnífico livro «Os filhos de D. João I» pág. 136: — «O rei, D. Duarte, seu irmão, pedia-lhe conselhos, e ele, de Bruges, em Flandres, dizia-lhe vendo cla­ramente os fortes e fracos deste Povo Português, ainda hoje o mesmo, depois de quatro séculos que valem por vinte cm esplendor de ação e, mais ainda, na grandeza das desgraças de que está cheio. Vivendo na Flandres, terra farta e clássica das quermesses, o Infante ce­lebra a sobriedade e temperança do nosso povo; mas logo adverte o «vício da basófia», que chama toda a gente à cor­te, enjeitando os filhos as profissões dos pais, afidalgando-se, formando esta nu­vem de parasitas que estão atulhando os paços dos reis, dos infantes e dos nobres e, agora, atulhando as escadarias das se­cretarias...».

Não se pode dizer melhor.

Será por termos nascido em terra for­mosa e de boa gente que estamos conde­nados a ouvir cantar a cantiga dos dege­nerados que se chama o fado?


R. R.»

E eu digo apenas: claro que «não se pode dizer melhor!»

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.