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quinta, 28 setembro 2023 14:28

MONTEMURO «GENTE DA SERRA E FORA DELA»

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A SERRA É A MINHA PRAIA

Então não é que ontem passei uma tarde inesquecivel na SERRA DO MONTEMURO? Nem queiram saber, corrijo para melhor, queiram saber claro,  pois é necessário e eu vos conto.

 

muralha-1Há dias fui contatado, via e-email, pelo Dr. Manuel de Lima Bastos, um aquiliniano encartado que, conhecendo bem as TERRAS DO DEMO pelas leituras e  “tresleituras” do MESTRE AQUILINO RIBEIRO (sobre o qual já escreveu uma dezena de livros), a residir ali para as bandas do Porto, mostrou desejos de vir à SERRA DO MONTEMURO na companhia de um seu amigo, de longa data. E, sabendo-me conhecedor da região por força de trilhar, anos seguidos, os carreiros e veredas  “pedibus calcantibus”, que desaguam em alcarias, poviléus, aldeias e vilas em redor de mim, perguntou-me se eu estava disponível a cirandar com eles no dia luminoso 27 de setembro, (ontem mesmo) tal como prometiam os SERVIÇOS METEREOLÓGICOS.

Que sim senhor, viessem eles. E vieram.

Eles, chegados dos lados de Cinfães e eu dos lados de Castro Daire, encontrar-nos-íamos, à 11 horas, no topo da SERRA DO MONTEMURO, “in situ dicitur Portas” e, ali mesmo, combinaríamos a agenda da tarde.

Montmuero-Caldoneira-1O Dr. Manuel de Lima Bastos, advogado que foi de profissão, habituado a cumprir os horários destinados às audiências nos tribunais do reino. Eu professor aposentado, habituado a cumprir os horários das aulas sinalizados pelo toque das campainhas. E o Dr. António Alves Ferreira, economista, gestor de empresas com empregados a seu cargo, comportámo-nos melhor que o mais refinado relógio suiço. Às ONZE, em ponto, todos estávamos a respirar os ARES PUROS e  saudáveis da SERRA DO MONTEMURO e, por convite meu, a mirarmos e as ruínas do RECINTO AMURALHADO que ali mesmo ficou como património edificado da CIVILIZAÇÃO CASTREJA. Aquele MURO em ruínas que, pelo seu valor histórico, estendeu o seu nome a toda a serra. Primeiro, “Monte do Muro”e, depois, por aglutinação, “MONTEMURO”.

Vimos tudo. Trocámos impressões sobre esses nossos antepassdos distantes e depois de gravarmos nas nosssas retinas e “in mente” a panorâmica que dali se alcança -  norte/sul/este/oeste - sugeri ao Dr. António A. Ferreira para levar em fotografia  a  CALDONEIRA, planta em vias de extinção, mas com um nicho de vida intra-muros. Aceitou a sugestão e levou no seu telemóvel não só a CALDONEIRA, mas também troços de MURALHAS que, estou certo, são ignoradas pela maior parte dos habitantes do concelho., com pena minha. Vivem na SERRA DO MONTEMURO e ignoram as MURALHAS, o MURO que está na génese do TOPÓNIMO.

LIMA BASTOSDali, depois de tudo visto e comentado, foi um voo  de milhafre até á aldeia de PICÃO e aterramos no restaurante «O CORVO», mesmo á beirinha da estrada. Ali onde almoçámos ã moda serrana que muito agradou aos visitantes. A sua opinião ficou patente e ao vivo no vídeo que ali fiz e cujo link anexo em rodapé.

Antes, porém, deixo registado que aos temperos da  refeição nela postos pela cozinheira,  somaram-se temperos que dão cor e sabor a uma conversa entre amigos. E um desses temperos  aqui deixo para os meus amigos e seguidores degustarem a seu jeito.

A páginas tantas do convívio e da conversa o Dr. Lima Bastos, com o traquejo adquirido nas barras dos tribunais do país, e basto repertório de anedotas que os homens das leis não encontram no Corpus Juris Civilis, de Justiniano, no Código de Hamurabi, nas Ordenacões Afonsinas e outras leis  avulsas por eles usadas no seu múnus, anedotas que eles contam para descontrair,  saíu-se com uma delas, com picante bastante, digna de se contar à mesa da refeição. 

Ouvia-a com gosto e considerei-a  um hino à inteligência humana, que  tanto honra a MAGISTRATURA PORTUGUESA (atualmente pelas ruas da amargura) como os ADVOGADOS que tudo fazem em prol dos seus constituintes.

DR. ANTÓNIO A. FERREIRAO caso foi que, durante uma rixa de fim de festa, uns copos a mais pelo meio, um aldeão chamou “filho da puta” ao seu contendor. Este, sentindo-se ofendido, levou-o ao tribunal e o  linguareiro outro remédio não teve senão recorrer a um advogado.

Foram organizados os resptivos autos e em pleno julgamento o advogado do réu,  muito senhor do seu oficio, tentaou convencer o Meritíssimo  Juiz de que aquela expressão “filho da puta” era muito vulgar no meio social dos desavindos  e não arrastava em si própria qualquer pendor ofensivo. E assim sendo,  atendendo à vulgaridade dela, ponderasse o MERITÍSSIMO JUIZ nas circunstâncias e absolvesse o seu constituinte, pois só com a ABSOLVIÇÃO se faria justiça.

O Meritíssimo Juiz, oriundo da província, bem conhecedor do vulgar linguajar popular, ponderou os prós e contras. E, depois de matutar por algum tempo, virou-se para o réu, fez-lhe as advertências  do costume, regras de viver e conviver em comunidade e, finalmente,  sentenciou:

- Vá-se lá embora, porte-se bem e tenha tento na língua. Está absolvido, mas agradeça ao “filho da puta” do seu advogado esta minha sentença.

video: https://www.youtube.com/watch?v=vhG1jIMXoyo&t=170s

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.