LITERATURA ESCRITA E FALADA
ESCRITA - 1
Esta página está ligada à aldeia de Serrazes e reporta um vendaval noturno que, segundo os jovens que tal presenciaram, não deixou pinheiros direitos em redor do caminho que eles levavam quando se dirigiam a S. Pedro do Sul, com o intuito de “irem ao cinema”. O fenómeno foi de tal monta que os obrigou a retroceder e dizer adeus à «fita», tal foi a surpesa e o susto. Era o “diabo a sete”.
Ora, face a coisa tão estranha e missteriosa, mais misterosa ela se tornou no dia seguinte, quando, retornados ao local, com o objectivo de colherem a lenha partida para a lareira, não havia sinal físico do rebuliço que ali tinha havido e que eles tinham visto e ouvido.
Claro que eu, mal li esta narrativa, foi num salto de pardal que a associei, imediatamente, ao registo que, em vídeo, fiz em FAREJA, quando entrevistei a DONA ROSINDA, nascida e criada nesta aldeia.
É que também ela, reportando-se aos tempos da sua meninice, diz ter passado por semelhante fenómeno: um “estardalhaço” noturno de “amieiros a quebrar”. O diabo à solta.
Cheias de medo ela e a mãe abandonaram a rega do milho, refugiaram-se em casa e, no dia seguinte, tendo a sua mãe, reressado ao sítio, ficou admirada e surpreendida de ver “tudo direito”.
FALADA - 1:
FAREJA - A VIDA E OS MEDOS VIVIDOS”
https://youtu.be/co-vMvjo5Vg
ESCRITA -2
E segue-se uma narrativa contada pelo avô da “informante” MARIA BIZARRO. Refere-se ao aparecimento inesperado de um cordeirro, nas cercanias da Ponte de Arcozelo, animal que, julgado perdido pelo passante, este resolveu pô-lo às costas e levá-lo até à povoação.
Só que, a cada passo, o estranho cordeiro tornava-se cada vez mais pesado e valeu ao bom samaritano ter vindo uma “revoada de vento” que, sem mais quê, fez desaparecer o animal pelos ares.
Ora, comparem esta narrativa, inserta no opúsculo editado pela Câmara de S. Pedro do Sul, em 2008, com aquela que se segue e eu recolhi neste ano de 2022, em Castro Daire, registada em vídeo.
Quedem-se na versão contada pela senhora DONA ZULMIRA, das Monteiras, ligada a um CABRITO, tida como autêntica e passada com o seu avô. A diferença, está, pois, entre um CORDEIRO e um CABRITO, mas ambas contadas pelo avô de quem as repetiu.
FALADA 2
LITERATURA ORAL E TOPÓNIMOS”
https://youtu.be/lgI_MyBCAcw
CONCLUINDO
Nós sabemos que as aldeias aninhadas nas pregas da Serra do Montemuro e seus habitantes não diferem muito das que se aninhavam e aninham nas serras do S. Macário, da Arada e da Gralheira. Por isso fica visível que estas narrativas, colocam bem perto de nós os tempos em que, por este Portugal em fora, a LITERATURA ORAL ERA RAINHA, nas lareiras serranas, onde até o fumo era um bem precioso e necessário ao tratamento das “carnes fumadas”, v.g. salpicões, chouriças e presuntos que, manufaturados nestas aldeias, entravam no mercado com a fama de serem “de LAMEGO”. Parecido, só o “VINHO DO PORTO”, que se produz bem longe da cidade que o chama seu. Coisas da HISTÓRIA e da (agri)CULTURA.
Deixando isso, podemos dizer que, cotejando as versões recolhidas e verificada a ESSÊNCIA delas (espaço, tempo, protagonistas, noite, medo, trabalhos noturnos, forças invisíveis, imagens estranhas, tudo servia par dar corpo à LITERATURA ORAL que, à falta de livros, jorrava da boca dos avós, dos mais velhos, geração após geração, qual ribeiro ou rio a deslizarem nas encostas da serra, qual àgua fresca de fonte, vivificante, a saciar a curiosidade e a desmedida imaginação da criançada, sempre faminta do encantatório fantástico e desconhecido. E sempre a interpelar os adultos sobre que animais e “forças ocultas”, medonhas e estranhas, se podiam cruzar com eles nos caminhos e trabalhos da vida.
E valorizando este tipo de LITERATURA (de narrativas) e as marcas que elas e os seus protaginistas deixaram na forma de pensar e agir das gerações dos anos 50 do século XX, eu não podeia deixar de lado mais um vídeo que fiz em CUJÓ com o meu cunhado João.
O objetivo era cotejar as diferentes versões orais existentes com o texto, não documentado por escrito, que, em 1993, deixei no meu livro “Cujó, Uma Terra de Riba-Paiva”. Para o caso presente destaco a parte final do vídeo, onde também o meu cunhado se refere, convitamente, a um CABRITO perdido, animal que não passava do DIABO disfarçado.
FALADA - 3
O PISOEIRO E O CABRITO PERDIDO
https://youtu.be/9SjbAtvyrbo