LAMELAS – OS SEUS TEMPLOS E MILAGREIS
Recentemente o meu amigo Fernando Parente, de Lamelas, remeteu-me, via Messenger, o desenho da Igreja de Lamelas, com uma legenda onde pode ler-se o emprenho do fundador e ermitão «José Lopes», assim: «Egreja dedicada a Nossa Senhora dos Remédios da Divina Providência, na montanha de Lamelas, em Castro Daire, feita com a esmola dos devotos. Lembrança oferecida aos benfeitores, implorando a proteção para a sua conclusão das mesmas obras». O Fundador e Ermitão, José Lopes». (Ver toto em rodapé).
E solicitava-me esse meu amigo para escrever algo sobre o assunto ou repescar o que já, por ventura, houvesse publicado. Respondi-lhe que sim, Que já tinha escrito uma crónica sobre essa Igreja no jornal «Notícias de Castro Daire» e no meu velho site. Que iria espiolhar os meus arquivos e se encontrasse tornaria a pôr on line o trexto publicado. É o que estou a fazer, tanscrevendo «ipsis verbis», a que acrescento, no final «O DESENHO» que me foi enviado, assim:
" Numa conversa informal com o senhor António Carlos Ferreira Cardoso, de 27 anos de idade, natural da freguesia de Lamelas, sapateiro de profissão, lamentava-se de, navegar na Internet, inclusive no meu site, e não encontrar nada sobre a igreja da sua freguesia.
Apesar de não ter a pretensão de aqui colocar toda a história concelhia, foi uma verdadeira alfinetada no meu ego. Um desejo daqueles não devia deixar de ser satisfeito, tanto mais que foi para mim uma satisfação imensa constatar esta realidade concelhia, não sei se é excepção, ver um jovem «sapateiro» a navegar na Net, sabendo haver professores, políticos e pessoas da comunicação social local que não pescam nada do assunto.
Pois bem, correr na peugada do templo de Lamelas, não pode ser feito sem passarmos, primeiro, pelo que se sabe sobre a «cristianização» das terras que viriam a ser integradas no concelho de Castro Daire, entre as quais aquela localidade.
E se começarmos pela vila diremos, com Gonçalves da Costa, que «em vista dos santos invocados na região, somos obrigados a admitir a formação de núcleos cristãos pré-nacionais, alguns à raiz mesmo da fundação da diocese. A primeira organizou-se no Castelo, à volta de uma ermida erecta em honra de S. Salvador, seguindo-se o de S. Pedro que viria a impor-se como centro paroquial visigótico. A par destas surgiram as invocações de S. João Baptista, S. Sebastião, Santa Bárbara, S. Lourenço, em Lamelas, São Tiago, em Baltar, São Martinho, em Farejinhas, o medieval S. Pelaio, em Vila Pouca, e outras».
Aqui temos a primeira surpresa. O primeiro núcleo terá aparecido «no castelo, à volta de uma ermida erecta em honra de S. Salvador». O autor baseou-se no testamento de Maria Valéria, feito em 19 de Novembro de 1686, que deixou legados para missas semanais e, portanto é considerada a «sua fundadora». Só depois veio S. Pedro, que hoje é o Padroeiro. A segunda surpresa é que o primeiro templo em Lamelas, era de invocação a S. Lourenço.
Ora, como não há culto sem gente, o censo mais antigo que se conhece sobre Lamelas, como aliás sobre o país inteiro, é de 1527, e por este se vê que existiam na povoação 29 moradores.
Uma das fontes sobre o estado dos templos nas paróquias e o exercício dos seus párocos são os textos que os «visitadores» deixavam escritos no chamado «Livro de Visitações».
Numa dessas visitas, feita em 1666, o visitador mandou aos moradores de Lamelas que «testelhem» a capela de S. Lourenço. Encontrou-a, certamente, com a cobertura em mau estado e daí a necessidade de deixar tal orientação. Telhas para cima.
Outra visita, feita em 8 de Abril de 1700, D. António de Vasconcelos, «achando que a capela de S. Lourenço, de Lamelas se encontrava em lugar ermo, sujeito à inclemência dos tempos, com tecto de forma alongada, mandou que os moradores a transferissem para lugar mais acomodado». (Costa, G. «História do Bispado e Cidade de Lamego»)
Um texto mais exaustivo sobre a actual igreja de Lamelas (a ermida de S. Lourenço, que é dela?), devemo-lo ao Padre Anselmo Fernandes Freitas, publicado, em 1955, na «Revista Catequística». Para que tenha a divulgação merecida eu o arranco da velha Revista e aqui o deixo «digitalizado» na íntegra:
«Em Lamelas tem Nossa Senhora um templo grandioso. É uma quase igreja sob o título de Nossa Senhora dos Remédios, podendo ser uma paroquial pelo seu tamanho. Tem nove altares convenientemente preparados e limpos que as mãos ordenadas e delicadas do Sr. padre Tavares, capelão dessa Santuário, carinhosamente tratam.
O culto é exercido com toda a pompa litúrgica chamando a ele crentes de toda a região. As Quarenta Horas de Lamelas têm nessa terra um sabor especial. Pelo seu púlpito têm passado os melhores oradores sagrados do país. É a sede de uma associação Mariana de que fazem parte filiados até mesmo de fora do concelho, à qual o Sr. Padre Tavares empresta o melhor dos seus esforços. Tem a capela dois torreões com sinos de relógio. Anexo à capela e fazendo parte da sua mole tem dependências que seriam na sua instituição primitiva s instalações para educação de crianças ou mesmo um orfanato.
A capela é moderna e deve-se a sua construção a um pobre operário de nome José Lopes que, sendo contuso em uma obra de pedreiro, prometeu, no caso de ficar sem defeito, mandar celebrar uma festa a Nossa Senhora e em todos os sábados mandar celebrar uma missa. O infortunado José Lopes é submetido a outra prova: um castanheiro na queda esmagou-lhe as costelas e ele promete uma missa diária e a construção de uma capela. Como não tinha rendimentos pessoais, percorre o país de lés a lés, angariando esmolas para a construção da capela de Nossa Senhora dos Remédios da Divina Providência. Nunca deixou atrasar o pagamento de salários aos operários que trabalhavam na construção. A Rainha D. Maria II ofereceu-lhe, além de dinheiro, o seu vestido de casamento. Celebrou-se aí a primeira missa em 30 de Janeiro de 1858».
Cem anos depois de se ter celebrado a primeira missa no templo, os habitantes da promissora terra que deu ao concelho de Castro Daire um presidente da Câmara, de seu nome João Augusto Matias Pereira, resolveu colocar à sua frente um busto em granito com a seguinte legenda: «A JOSÉ LOPES FUNDADOR DO SANTUÁRIO DE NOSSA SENHORA DOS REMÉDIOS OS CONTERRÂNEOS AGRADECIDOS – 1958».
Abílio Pereira de Carvalho
(2007)