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quarta, 02 dezembro 2020 21:16

DELFIM FERREIRA DA SILVA

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DELFIM FERREIRA DA SILVA

Agradável surpresa. Em 2018 desloquei-me à aldeia da Moita, concelho de Castro Daire, a casa do senhor Delfim Ferreira da Silva. Tínhamos falado pessoalmente na vila, a propósito de PATRIMÓNIO histórico e divagado sobre poesia. E disse-me que possuía em sua casa muito material recolhido relacionado com a vida do seu tempo, do tempo dos seus pais e avós dos nossos avós.

CAPA - Cópia

Fiquei em fazer-lhe uma visita, um entrevista, registar em vídeo e pôr no mundo um DOCUMENTÁRIO HISTÓRICO do que, verdadeiramente, devia possuir o MUSEU MUNICIPAL DE CASTRO DAIRE. O prometido é devido e assim fiz.

Fiquei espantado e encantado. Hoje reponho, em rodapé esse vídeo, pois, ele complementa a leitura que acabei de fazer, de fio-a-pavio, do livro que, neste ano de 2020, com o título “PAIXÕES, SENTIMENTOS E VERDADES” ele publicou (edição pessoal) com a poesia que lhe corre nas veias.

O senhor Delfim assume-se como poeta.

Os meus dias passam rapidamente

Como se dispersa uma nuvem no céu

Assim não pensará toda a gente

Do mesmo jeito Que eu!

Ele descortina poesia em cada coisa onde põe os olhos. Caracterizamente poesia popular, sem pretensão a figurar em qualquer antologia escolar, nela se nota que o verbo, a palavra, substantivo e adjetivo, não acompanham, nem alinhavam, nem rendilham os seus pensamentos, sentimentos e emoções, segundo os paradigmas poéticos institucionais.

Pois. De pensamento formatado numa comunidade cristã, com o grau de literacia alcançada na ESCOLA PRIMÁRIA, tudo quanto escreve transpira os princípios da comunidade onde nasceu, cresceu e se fez gente, com a roupagem resultante das lacunas e contradições vividas e sentidas nos caminhos por onde andou e pessoas com quem viveu e conheceu em Portugal e no estrangeiro. Um tom catequético é, a bem dizer, a banda sonora do fita que ele faz girar em letras visando mostrar nelas traços da sua personalidade e caminhada de romeiro, nas encruzilhadas da vida por onde andou, sempre de olhos e coração abertos:

Tenho o verde aqui tão perto

Ao lado da minha varanda

Mais longe parece um deserto

-“Meu Deus, como isto anda!

DelfimAssumindo-se poeta e  nessa condição discorre e escreve. E não fora o apego que ele tem à rima (há quem pense que tudo o que rima é poesia), outro galo cantaria. Os pensamentos, as vivências e emoções de alegria, amizade e tristeza, encantos e desencantos, que transferiu para o papel (agora em livro) estariam mais de acordo com o brilho do seu olhar e inquietações. E a sua imaginação e criatividade surtiriam outro apelo e outro chamamento. O turbilhão desses sentimentos e formas de olhar o mundo encontra, seguramente, na RIMA o tolhedouro que desvia a água do rodízio do moinho e lhe trava o movimento, às vezes a moer e bem e pertinentemente atitudes políticas bem dignas de serem reduzidas a farinha:

(...)

Oferecem canetas e bonés

Cartazes aos pontapés

Nas paredes e no chão.

Depois parecem de lés a lés

Não se importam quem tu és

Em por igual consideração.

 

quixoteAntes, se lhe peço um favor

Dizem logo: “sim senhor

Disponha sempre, senhor Delfim”!

Mas como não me trajo a rigor

Para eles não tenho valor

Até se afastam de mim.

 

Ajudam e patrocinam

Para onde eles querem e se inclinam,

Em eventos, desportos e muita coisa boa, útil e bonita

Só que ainda não atinam

Que se não souberem, não ensinam

O de não haja a cultura da escrita.

(...)

troco-1Exigente que sou, comigo mesmo, nestas coisas da escrita, e exigente que sempre fui com os meus alunos no campo da literatura, li o livro do princípio ao fim pelo respeito que me merecem as pessoas simples que, cruzando-se comigo na vida, se revelam autênticas, sãs, sem bancar a intelectuais. Aquelas que, de forma simples, me dizem mais os seus gestos e comportamentos humanos do que aquilo que dizem e escrevem.

Cedo me habituei a saber que não são as palavras, ditas ou escritas, (bem ou mal, segundo a regra gramatical) que revelam a verdadeira essência humana. São sim as suas atitudes e comportamentos face ao seu semelhante e pegada deixada no trilho da imaginação e da criatividade revestidas de honestidade. Sempre me bati pela autenticidade humana terçando armas contra a hipocrisia e “conversas interesseiras e de conveniência”. E ele é isso mesmo, ele próprio, autêntico, simples, humano, mas atento:

Amigo me apercebi

Que sorrias nas minhas costas.

Se eu fizesse o mesmo a ti?

Será que tu também gostas?

tronco-2Atento aos comportamentos pessoais e sociais, olhos postos na natureza, sensível às coisas, objetos e ferramentas como extensão humana que são, basta entrar na sua garagem, na Moita. Aquilo é um MUSEU e um MUSEU é uma BIBLIOTECA. Nenhuma das peças ali existentes, caiu do Céu. Foi o seu sensível olhar poético, o seu respeito pelos nossos antepassados e propósitos de deixar a “vida-morta” aos vindouros vivos que, com o aval da esposa e da família, ali foram recolhidos e guardados. “Um por todos e todos por um”.

Falei-lhe há dias nas antigas “cardas” muito usadas no nosso meio pelos profissionais cardadores, numa das fases do fabrico de tecidos de lã. Não tinha. Mas pôs pés a caminho e anda a diligenciar no sentido de as desencantar algures.

Que mais não fora, por tudo isto, o senhor DELFIM FERREIRA DA SILVA teria de merecer a minha consideração, o meu respeito, a minha estima e a gratidão de me proporcionar escrever estas linhas e pôr no mundo, por boas razões, mais uma figura natural do concelho de Castro Daire, à semelhança do que fiz com o vídeo, em 2018, cujo link se anexa. Ora vejam:

 https://youtu.be/i1jCV7rUPyk



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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.