NA COSTA ORIENTAL DA ÁFRICA
Já há tempos, neste meu espaço, me reportei a um amigo e colega de estudos, lá nas longínquas costas banhadas pelo Índico. Era natural de Britiande, Lamego e os ares nortenhos que ambos respirámos por estas bandas, deram o seu contributo à nossa aproximação de companheirismo na luta que travávamos no campo da HISTÓRIA.
Exercendo ele a profissão de Inspetor nos serviços de Atividades Económicas, reconhecida a sua impossibilidade de frequentar assiduamente as aulas, (diferentemente de mim) pediu a minha contribuição naquela sua caminhada de fazer as cadeiras que davam corpo ao CURSO DE HISTÓRIA na Faculdade de Letras da Universidade de Lourenço Marques. Acedi solidariamente às suas pretensões e ele nunca deixou de agradecer os meus contributos.
A DESCOLONIZAÇÃO disparou familiares, colegas e amigos para horizontes políticos e profissionais diferentes, acontecendo até que ele, por império das leis militares das quais beneficiava e podia fazer os exames fora das épocas estabelecidas) acabou o curso antes de mim e, na sequência, aproveitando a embalagem fez o curso de DIREITO. Dois em um. O senhor Doutor em duplicado, o que muito me agradou.
Por diligência minha viemomos a encontrar-nos pessoalmente, há muitos anos, em Britiande. Depois, a lufa-lufa da vida, sempre a roubar-nos a todos o que de melhor tem - o convívio - mesmo que presentes no pensamento, ausentes e distantes temos estado: ele lá pela capital. Eu cá pela província.
Recentemente tomei mais uma vez a iniciativa de chegarmos à fala. Montei a mota, fui a Britiande na presunção de encontra-lo. Não aconteceu, mas falei com o irmão António que nos pôs imediatamente em contato via telemóvel. Dei disso nota nas minhas crónicas pondo o enfoque nos tempos de AMIZADE, de GRATIDÃO, de LEMBRANÇA e de ESQUECIMENTO.
É só investigar neste meu espaço etéreo, onde vou dando o testemunho de um passado que deixou marcas nos arquivos mentais ou no papel onde persistem em manter vivas e seguras no baú das MEMÓRIAS.
Hoje, procedendo à arrumação de papelada que me acompanhou de Moçambique, de retorno à Pátria (nos porões do paquete “Pátria” me acomodei eu na ida e mais uns tantos que viajávamos em 3ª classe) encontrei quatro CARTÕES DE VISITA, nos quais esse meu amigo se mostra agradecido pela minha ajuda.
No primeiro, ora leiam, por razões familiares, comunica-me a impossibilidade de levarmos por diante “o programa delineado”. E o programa era o encontro no Café Manuel Rodrigues para termos uma “sabatina” sobre a matéria que eu lhe transmitia, quer oralmente, quer através das “cassetes” com as gravações das aulas. E pede-me para eu, como Diretor Cultural da " Casa das Beiras", na impossibilidade de ele estar presente o "representar na Casa do Minho".
Isso mesmo diz ele no segundo cartão, pedindo-me para as deixar na sua posse mais tempo, visto estar ocupado na resolução das avarias do seu carro.
E no terceiro cartão comunica-me que está em casa às voltas com as SEBENTAS DA EXPANSÃO (da autoria do Professor Alexandre Lobato, que ainda guardo na minha biblioteca) e pede o meu auxílio, se pudesse ser, ao fim do meu dia de trabalho, de «magistério», palavras suas.
No último, dada a matéria da EXPANSÃO estar por demais sabida, pede-me para eu esclarecer “os feitos da Revolução de 1383-85”. Vê-los sob a minha “crítica, orientação de professor e o mais que se verá”. Caso não pudesse que lhe telefonasse.
Curiosamente, dias atrás mesmo, publiquei no meu mural do Facebook umas linhas relacionadas com o encontro que tive com uma ex-aluna minha, reconhecendo ela, junto de uma amiga, o mérito do meu método de ensino da HISTÓRIA. Diferentemente de outros professores que teve, disse ela. Hoje encontrei estes “cartões-de-visita” a remeter para os meus princípios de carreira docente. Não resisti a digitalizá-los e publicá-los, dando vasão a este meu velho e relho hábito de “FAZER PEDAGOGIA DENTRO E FORA DA ESCOLA”. É verdade. Onde é que eu usei e abusei, há pouco tempo, deste chavão como título de vários vídeos?
Tudo, aos 80 anos de vida, aposentado, sem precisar de enriquecer o meu curriculum vitae. Tudo para transmitir somente os valores de MÉRITO versus MEDIOCRIDADE. Valores de SOLIDARIEDADE e de RECONHECIMENTO. Valores de AMIZADE e de GRATIDÃO, documentados.
Este apontamento, apesar de distanciado no tempo, é o complemento daqueles outros apontamentos que escrevi envolvendo esse meu amigo e companheiro de estudo, o Dr. JOAQUIM PEREIRA GUEDES. Aquele que, lá, em L.ourenço Marques, pelo Natal, me ofereceu, agradecido, a coleção de luxo de 5 volumes “Grandeza e Decadência de Roma”.
Telefonei-lhe ontem à noite. Estava numa pastelaria, onde me ouvia muito mal. Perguntei se era da idade ou do meio ambiente. Respondeu sinceramente que “não sabia”. E eu fiquei a interpelar-me:
- Onde está aquele colega dinâmico, a correr de lado para lado, a trabalhar e a estudar simultaneamente como eu e, acabado um curso, tirar logo outro de seguida?
Ficou em me telefonar. Eu, por enquanto lúcido e lembrado da batalha vencida na forja da amizade e solidareidade, aguardo.