Trilhos Serranos

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quinta, 19 janeiro 2017 15:03

TROPA - REGIMENTOS MILITARES, 2

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TROPA, 2

JURAMENTO. Repare-se como ele começa. "Eu foão" (não é gralha, nem engano) é tão só o "F..." que chegou às minutas das nossas repartições, a iniciar qualquer documento. Lembram-se? Aí vai:

 "Eu foão que ora fui eleito por ElRei Nosso Senhor, ou por seu mandado para Capitão Mor da gente de tal lugar que Sua alteza para defensão dele manda armar, juro aos Santos Evangelhos , em que ponho as mãos, que quanto em mim for, serei sempre prestes a dita gente para serviço de Sua Alteza e defensão do dito lugar e obediente a seus mandados como bom e leal vassalo e  favorecerei as justiças e as ajudarei em todos os casos que se oferecerem e por elas me for requerido e em que de minha ajuda tiverem necessidade e  com a dita gente em defensão do dito lugar farei guerra da maneira que por Sua Alteza me for mandado. E assim mesmo juro aos Santos Evangelhos que da dita gente, nem de parte dela usarei, nem me ajudarei em caso algum particular meu, de qualquer qualidade que seja, posto que muito toque e importe à segurança de minha vida ou conservação e acrescentamento de minha honra, nem que toque e importe a algum parente meu, ainda que seja mui chegado, nem algum meu amigo, nem a outra pessoa alguma. 

E de todo o sobredito faço preito e menage a Sua alteza, uma, duas e três vezes, segundo o uso e costume destes Reinos e lhe prometo e me obrigo que o cumpra e guarde inteiramente como acima é dito, sem arte, cautela, engano, nem minguamento algum. E outro sim juro aos Santos Evangelhos que cumprirei e guardarei em todo o meu Regimento e suarei inteiramente da jurisdição que por Sua Alteza me é dada, sem usar de mais outra alguma jurisdição. E por certeza do que dito é assinei aqui de minha mão em tal parte s tantos de tal mês e de tal ano». (...)

E os Capitães das Companhias farão o dito juramento aos Capitães Mores de que outro sim se fará assento pelo Escrivão da Câmara de cada lugar, assinado pelos ditos Capitães e testemunhas, em um Livro que para isso haverá, de que as folhas serão numeradas e assinadas pelo corregedor da Comarca. Os quais livros em que se escreverem os ditos juramentos estarão em muito boa guarda (...)"

 Sebastião - REDZComandos identificados, juramentos feitos na Câmara, eis algo que não podia deixar de destacar, transcrever e comentar, antes de prosseguirmos a leitura do REGIMENTO. Faço-o porque os "procedimentos" jurados andam tão alheios de nós todos que é oportuno dar à HISTÓRIA o estatuto que merece: uma PROFESSORA sempre disposta a ensinar quem disposto se mostra a aprender. Ora releiam:

"E assim mesmo juro aos Santos Evangelhos que da dita gente, nem de parte dela usarei, nem me ajudarei em caso algum particular meu, de qualquer qualidade que seja, posto que muito toque e importe à segurança de minha vida ou conservação e acrescentamento de minha honra, nem que toque e importe a algum parente meu, ainda que seja mui chegado, nem algum meu amigo, nem a outra pessoa alguma".

Pois é. Hoje toda a gente procede assim. Desde os membros do Governo aos administradores de empresas públicas, Presidentes das Câmaras Municipais e outras instituições espalhadas pelo país, tal como sabemos pelos jornais, televisão e redes sociais. O nepotismo, o compadrio, o amiguismo, o clientelismo estão fora de moda. Eu tenho perdido algum tempo a vociferar contra isso. Mas desnecessariamente. É só para me entreter. Pois hoje quem é que faz isso? Ninguém. 

O jovem rei, com a cabeça repleta de novelas de cavalaria, ao ponto de enfrentar os mouros em Marrocos com o tipo de tropa que iremos conhecer, não deixava de estar rodeado de conselheiros com calos no rabo, sobejamente conhecedores da essência humana. E este texto, como outros respigos que veremos a seu tempo,  é bem a prova disso.

Comandantes eleitos na Câmara ou providos pelo Rei, o que comandavam eles? Eram as ESQUADRAS, as COMPANHIAS e as BANDEIRAS, assim:

  "E toda a gente que pela dita maneira achar que há na cidade, vila ou concelho, repartirá por esquadras de vinte e cinco em vinte e cinco homens, tomando para isso os mais vizinhos que melhor se possam ajuntar. E para cada esquadra elegerá o Capitão da Companhia um homem da terra que for mais para isso, que seja seu Cabo, ao qual serão obrigados acudir os vinte e cinco da sua esquadra todas as vezes que os ele requerer e em tudo lhe obedecerão segundo a ordem que pelo dito Capitão Mor lhe for dada.

Cada Companhia será de duzentos e cinquenta homens, em que haverá dez esquadras e terá um Capitão, e um alferes e um Sargento e um Meirinho e um Escrivão e dez Cabos.

E ao Capitão da companhia acudirão os dez Cabos de esquadra dela cada vez que cumprir ajuntarem-se ou lhe ele mandar e em tudo lhe obedecerá como a seu Capitão.

 E se o número de gente que assim houver não bastar para se fazerem  todas as ditas Companhias de dez esquadras e faltar na que por derradeiro se houver de fazer alguma esquadra, ou esquadras, terá o dito Capitão esta maneira. Que se faltarem até três esquadras para cumprimento das dez que são necessárias, fará companhia das que ficarem; e faltando mais de três esquadras não fará companhia e repartirá as esquadras que houver pelas outras companhias que estiverem feitas como lhe parecer. E nos lugares em que houver menos de duzentos e cinquenta homens, se ajuntará com eles gente das aldeias e Casais do Termo para fazerem uma Bandeira de duzentos e cinquenta homens, contanto que não estejam em distância de mais de uma légua das cabeças, nem possam per si fazer Bandeira. E nos mais lugares em que por esta maneira se não puderem fazer os ditos duzentos e cinquenta homens se fará todavia companhia de duzentos e de cento e cinquenta e de cento.

E nos lugares e freguesias em que não houver cumprimento de cem homens, nem se puderem comodamente ajuntar aos outros lugares vizinhos conforme este Regimento se farão somente Cabos de Esquadra que tenha cada um a seu cargo vinte e cinco homens, conforme o acima dito. E aos ditos Cabos exercitar pela ordem deste Regimento; não havendo gente para duas esquadras se ajuntará toda a uma esquadra ou as que houver.

E nos Lugares do Termo que estiverem fora da dita légua se guardará a ordem acima dita no fazer das companhias.

Eis, pois, como estava estruturado o exército com que contava D. Sebastião. Já vislumbrámos que cada moradia de vassalo era um quartel, fosse nas cidades, nas vilas e aldeias concelhias. E reportando-me às aldeias alcandoradas nas vertentes da serra do Montemuro e arredores, vejo bem a dificuldade tornar operacionais as células militares estatuídas. E naturalmente as influência de pessoas gradas a interferir, a pedido dos interessados, na fuga à Ordenança.  Havemos saber mais, quando presenciarmos o exercício militar que preparava toda esta gente para a guerra.(CONTINUA)

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.