pardal
Abilio
Num livro das vereações da Câmara de Castro Verde, relativo ao ano de 1680, encontra-se uma decisão dos edis que ao tempo ocupavam o poder e bem assim o resultado dessa decisão, feita no ROL DOS PARDAIS que ficou registado na contracapa de pergaminho do mesmo livro. Eu transcrevo com todo o sabor da época.
«Aos quinze dias do mês de Abril de mil seiscentos e oitenta anos, nesta vila de Castro Verde, perante mim escrivão da Câmara, apareceu Francisco Guerreiro, porteiro deste concelho e por ele me foi dado fé que ele, por virtude e mandado dos oficiais da Câmara desta vila pregoava para toda a vila ao domingo na porta da igreja, saindo a gente da igreja para que todos tivessem notícia do pregão da postura da Câmara sobre os pardais em que o dito porteiro pregou que toda a pessoa, digo, cada morador deste povo, assim da vila como do termo da légua a dentro, trouxesse, como era obrigado a trazer, em cada um ano, meia dúzia de pardais, sendo novos, e sendo velhos quatro, com pena de duzentos reis para o dito concelho em que seria condenada toda a pessoa que os não trouxesse este presente ano de mil seiscentos e oitenta e os levassem a casa do escrivão da Câmara para os haver por desobrigados e todos aqueles que lhe apresentassem a dita quantia de pardais e de como o dito porteiro, por mando dos ditos oficiais, pôs em execução e apregoando a dita postura da Câmara em que eu escrivão lhe ia ditando ele apregoando de que dou sua fé...»
Esta a decisão tomada naquele dia, mês e ano, mas na contracapa do mesmo livro, ficou o nome dos «contribuintes» e o número de pardais que cada um deles entregou. Ao todo foram 112 moradores, da vila e termo e 1.102 o número de pardais entregues.Ao nome de alguns moradores, para além da identificação da residência, junta-se a sua profissão: alfaiates, tecelões, almocreves, ferradores, sapateiros, barbeiro, alfaiates, pedreiro, tendeiros.
Ora, visando esta decisão a protecção das searas, nas quais os pardais, pelos vistos, faziam forte estragos e eram considerados uma «praga», verifica-se que ela se aplicava a toda a gente, como dizia a letra do «pregão» e não só aos agricultores.
Mas o caso deve ter dado que falar no soalheiro vilão, pois a decisão veio a ser alterada, posteriormente, e os moradores em vez de entregarem os «pardais inteiros, novos ou velhos», passaram a ser obrigados a entregar somente as «as cabeças» deles.
Não encontrando outra explicação, deduzo que tal mudança procurou esvaziar de sentido, quiçá, a suspeita de que os pardais serviam para saborosas arrozadas em casa do escrivão onde eram entregues. Numa só penada cortou-se rente a suspeição. Uma atitude esclarecedora na relação entre governantes e governados.

