LUCY
Neste meu afã de nos tempos livres (que são poucos) percorrer os programas disponíveis na TVCABO, deparei, um dia destes, com um nome no meio de écran: «LUCY», somente «LUCY», no canal «FOX-MOVIES».
Num ápice, tal como um relâmpago a rasgar o céu em noite escura, esse nome transportou-me para algo distante no espaço e no tempo, arquivado na minha memória.
Pus de lado o comando da televisão e deixei-me ficar. Aconcheguei-me no sofá, manta sobre os joelhos que vão dando sinais de desgaste, e, ali sentado, eu, docente aposentado, tornei-me aluno do conhecido artista Morgan Freeman a desempenhar o papel de PROFESSOR empenhado a explicar à turma inteira (alunos por sinal bem atentos e interessados no tema) a sua teoria sobre a EVOLUÇÃO DA VIDA E DO CÉREBRO HUMANO, em constante mutação. Explicação e divisão natural das células, a sua multiplicação, a preservação das aprendizagens e a transmissão às gerações seguintes de todos os saberes acumulados. A baixa percentagem, para já, do aproveitamento da massa cerebral e, nesse processo evolutivo, o que se podia esperar-se de cada um de nós, à medida que essa percentagem fosse subindo de 10%, 20%, 30%, 50%,, sempre em crescendo, se para tal concorressem as necessárias e propícias condições ambientais e sociais, vegetais, animais e humanas.
E, durante a explicação, desfilam à nossa frente as imagens da reprodução de todos os seres vivos, do namoro, do acasalamento do nascimento, do predador e da presa, aspetos da vida tal qual se conhece na selva rural e na selva citadina. A luta pela sobrevivência: Muito sangue à mistura em cada um dos espaços e dos tempos.
E a lição prosseguia na sua toada própria, (num só filme, muitos filmes) alunos de olhos esbugalhados e atentos, até que, lá do fundo da sala um deles, como é costume, levanta o braço e, mais palavra, menos palavra, pergunta: «ó senhor professor, mas se nesse processo evolutivo gradual, houver alguém que, por mero acaso, atinja os 100% da capacidade cerebral, que sucederá?»
O Professor, olha fixamente o aluno interpelante e, humildemente responde: «não sei dizer-lhe».
Aconteceu que, nessa evolução natural, e dadas as ambições do HOMEM, mais interessado no TER do que no SER, apareceram cientistas e laboratórios virados para a descoberta de uma droga capaz de acelerar o processo e, com ela, poderem ganhar mundos e fundos. Descoberto que foi o produto, havia que distribui-lo pelo mundo e, para tal, necessários eram os "correios" que se sujeitavam a deixar abrir a barriga e, dentro dela, transportarem os embrulhos. E foi assim que, a contragosto, nos apareceu a linda Scarlett Johansson (uma estudanre que deu provas de conhecer bem a teoria do professor) forçada a transportar no abdómen a poderosa droga, cujas substâncias ao serem absorvidas pelo seu corpo a tornaram super-poderosa, senhora de telepatia, telecinesia e ausência de dor. Capaz de, num só instante, dominar energia, comunicações, tempo e espaço com conhecimento instantâneo da evolução. Muitos fitas e efeitos especiais numa só fita, com polícias de permeio a zelar pelas regras sociais que a selva humana exige.
Trata-se de ação e ficção científica de 2014.
Gostei de rever dois artistas que já conheço de outros filmes. Scarlett Johanson e Morgan Freeman, esse meu colega empenhado em saber e transmitir saber.
O filme, segundo o meu critério, termina de uma forma genial: a LUCY, essa primata peluda junto de uma ribeira, a tentar beber água com uso da mão, é surpreendida pela LUCY «civilizada». Esta comtempla aquela e estendendo o braço e a mão, estica o dedo indicador, assim a modos como Miguel Ângelo, na Capela Sistina, pintou o quadro onde o Criador aproxima o dedo do ser criado para lhe transmitir o sopro da vida.
É um remate de excelência. Um final em sintonia com toda a trama do filme. Mas, ao invés da intenção de Miguel Ângelo, na aproximação daqueles dois dedos, das duas Lucys numa só, vejo o arco voltaico da luz da gratidão e dos poderes humanos que a LUCY "civilizada" recebeu daquela LUCY "primitiva" cuja ossada a arqueologia trouxe até nós. Feitas e observadas todas as mutações, o professor, com a sua teoria elaborada acerca da evolução do cérebro humano, limita-se, a medo, a estender a mão e a segurar uma espécie de PEN decomputador pronta a transportar ali todo o conhecimento humano. E, segurando-a na mão direita, fita o mundo, como quem diz: «eis ao que chegámos».