Trilhos Serranos

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quarta, 27 abril 2016 08:39

DO LOUCO AO CRENTE

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ESTRANHA FORMA DE VER

É isso. No dia em que a Igreja põe mais dois santos nos altares, dá-me para filosofar. 
Quem não se lembra daquele vagabundo do porto de Piréu, felicíssimo por tudo o que via em redor ser seu? 
Era um louco. 

Quem não se lembra do Diógenes à procura de um homem, de lanterna na mão, em pleno dia, nas ruas de Atenas, ou metido no barril e pedir a Alexandre, o Grande, que se desviasse da sua frente e lhe deixasse apanhar sol? 
Era um filósofo. 
Eu me lembro de um andarilho, quilómetros e quilómetros sem parar, sem falar com ninguém, sempre a andar como um autómato, pelas ruas e avenidas de Lourenço Marques, que tinha regressado das partes da guerra, lá de cima, do norte, onde, por certo, viu a morte? 
Estava apanhado do clima.
Eu me lembro de um professor de filosofia a quem um tumor no cérebro toldou o saber e o procedimento, expondo lampejos do seu pensamento de rua em rua que, de tão consequente e eloquente, apetecia segui-lo e ouvi-lo? 
Era um doente. 
Eu conheço um senhor que disparata ou discursa, ora cirandando por tudo o que é espaço público, ora sentado num banco de jardim, e dali debita sermão, ciente ou não do auditório que tem à sua frente e que só ele vê e crê que está de ser ouvido, se calhar, seguido? 
É um tolo.
Quem não vê o povo ajoelhar-se à frente de uma imagem, de madeira ou de barro, rezar, fazer preces, falar com ela como se fosse gente?  
Não. Esse povo, não é louco, não é filósofo, não está apanhado, não está doente, não é tolo. 
Esse povo é simplesmente um povo crente.


NOTA: publicado no FACEBOOK em 27/abril/2014





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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.