DOCUMENTOS HISTÓRICOS
Uma pessoa amiga, de Folgosa, o Mário, sabendo-me apreciador de documentos antigos, papéis manuscritos ou impressos, objetos utilitários, vários, saídos da inteligência humana para a humanidade servirem, ofereceu-me um GASÓMETRO MINEIRO (e doméstico) num estado lastimável. Na rodela metálica do “registo” enroscado na parte superior, depois de limpa, ainda consegui ler a marca “DOCAM” e a chancela da firma CAMPOS & CORREIA”.
Calcinado, peças presas umas às outras pelas garras da ferrugem, tive de o mergulhar OITO DIAS, por inteiro, num alguidar de “óleo queimado”, outros tantos dias a escorrer ao ar livre para, ao fim de todos deles, eu, manápulas enluvadas, com jeito e sem esforço, poder “desenroscar” as peças constitutivas, tal qual se veem nas fotos que ilustram este apontamento.
Procedi à limpeza, à pintura, à montagem e disso fiz o vídeo que anexo em rodapé. Este texto é um complemento desse vídeo. É um documento comprovativo de quanto “estou velho” e me “remoço” quando navego no barco das MEMÓRIAS práticas que me transportam, afetuosamente, às pessoas, tempos e espaços que fazem parte de mim, que estruturaram a minha personalidade e maneira de estar no mundo, que não só leituras de filósofos, cientistas, escritores e poetas.
Já não é a primeira vez que trago a este meu espaço a AZÁFAMA vivida em CUJÓ, concelho de Castro Daire, no tempo do MINÉRIO, o tempo da SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1939-1945), gente a esburacar serras, montes e outeiros na perseguição de um filão de VOLFRÂMIO ou mesmo a peneirar terras de aluvião postas em cima de um carro de mão.
E que trabalheira aquela de “lavar” o conteúdo do “carro de mão” na tentativa de nele se encontrarem uns gramas de VOLFRÂMIO, aquele ouro negro, pesado “pra diabo”, tão apetecido por alemães e ingleses destinado ao fabrico de material de guerra.
Eu recordo:
“Os volframistas (eu, pequeno, também fiz isso) de joelhos, junto à gamela, debruçados sobre ela, posta num rego de água, mãos calejadas, dedos ágeis a empurrarem a terra para a cabeceira, onde deslizava lentamente uma película de água transparente, da espessura de papel celofane, por forma a levar a terra e deixar o minério preso, pelo peso, à tabua de base. Um sonho negro de todos aqueles que a ele se agarravam para ganhar o “pão de cada dia” fora dos campos de semeadura”.
E lembro o que escrevi, há anos, sobre as MINAS DA QUEIRIGA, concelho de Vila Nova de Paiva, sobre as toupeiras humanas que esventravam aqueles montes na procura de “material de guerra” desejado E, dentro delas, mirando silenciosamente aquelas galerias, assim pensei e disse:
“Ouve-se o desalento traduzido na cantiga que prevaleceu através dos tempos: «eu no minério trabalhava, trabalhava/todos ganhavam só eu não ganhava nada». Ouve-se o mando e comando do concessionário, do capataz, ouve-se, lá longe, o troar dos canhões feitos com o volfrâmio exportado para os contendores da 2ª Grande Guerra - Ingleses e Alemães. Naquelas minas está aberta uma página da vida humana. Uma lição de geologia, de história, de técnica, de cultura, de trabalho, de vida. E virá o tempo em que elas entrarão num qualquer roteiro turístico dirigido às pessoas que na vida querem ver algo mais do que igrejas, pelourinhos, castelos, mosteiros ou alminhas”.
No vídeo (que anexo em rodapé) relativo ao GASÓMETRO relevo o facto de proceder à recuperação de um utensílio muito usado durante a SEGUNDA GRANDE GUERRA MUNDIAL, neste ano de 2022, ano em que também decorre a GUERRA que a FEDERAÇÃO RUSSA começou com a invasão à UCRÂNIA, país da sua fronteira. E sem contemplações, numa postura expansionista/imperialista, se dispôs a lançar mísseis atrás de mísseis, arrasar cidades e aldeias, quarteis e hospitais, escolas e bairros habitacionais, matando indiscriminadamente, militares, civis, idosos e crianças. A HISTÓRIA MODERNA não registava BARBARIDADE semelhante depois dessa outra GRANDE GUERRA. Nem era de esperar que registasse, chegado que foi o MUNDO ao atual grau civilizacional.
Mas aconteceu. E tal INVASÃO e PROCEDIMENTO MILITAR fazem bem lembrar a GUERRA DE 1939-1945 e comparar os RESPONSÁVEIS por tão dramáticos acontecimentos humanos. Uma deslocação de pessoas e refugiados nunca vista, gente que obrigada foi a abandonar as terras e os lugares onde, pacificamente, desenrolava a fita das suas vidas.
Daí o registar-se a COINCIDÊNCIA de eu me dar ao trabalho de restaurar um GASÓMETRO muito usado na exploração do MINÉRIO utilizado no fabrico de MATERIAL DE GUERRA, durante a SEGUNDA GUERRA. Utensílio que funcionava à base do “gás acetileno”, fruto da reação química da água com o carboneto, também dito carboreto. E, curiosa coisa, a FEDERAÇÃO RUSSA, ter no petróleo e no GÁS que exporta, em grande quantidade para a EUROPA, a base de sustentação económica com que alimenta a GUERRA que iniciou e a EUROPA contesta e contraria.
Como cidadão atento ao mundo, que interpela os documentos, que ouve o que as “coisas” inertes (e fora de uso) nos dizem de humano, a nós humanos, quando humanos somos, almejo que se FAÇA A LUZ DA PAZ entre as NAÇÕES em contenda e não a luz do GASÓMETRO que alumiava as minas subterrâneas, nem a luz que atualmente alumia os búnqueres onde se abrigam os ucranianos para escaparem aos bombardeamentos que, sem alvo certo, vindos do CÉU, fazem da TERRA um INFERNO.
VÍDEO: