Em 1593, o abade de Castro Daire, Francisco Rodrigues, dotou a capela de Santo António, da vila de Castro Daire, com foros e bens de raiz que deviam ser administrados pelo seu sobrinho e sucessor Pe. Domingos Rodrigues, com ónus de ali celebrarem missas semanais pela sua alma.
Em 1625 foi a vez do seu sucessor, abade Domingos Rodrigues, passar os bens e o ónus para o seu sobrinho, Sebastião Rodrigues do Amaral, também abade de Castro Daire, em cujo testamento, datado de 1663, arrolou uma vasta cópia de «terras», «campos», «lameiras», «vinhas» «linhares» e foros pagos em géneros, dentro e fora do concelho de Castro Daire.
Com tal cópia de bens o abade achou por bem instituir um morgado e foi o que fez, deixando como primeiro administrador o Dr. João Rodrigues de Almeida, que, por sua vez, em testamento, datado em 1698, acrescentou ao património herdado mais umas tantas propriedades.
Não podia adivinhar o abade que os bens vinculados à capela de Santo António pelos seus antecessores e por si próprio, agora instituídos em morgado, haviam de dar origem à «demanda» judicial que se arrastou pelos tribunais do reino grande parte do século XVIII (dezoito) e ultrapassou o primeiro quartel do século XIX (dezanove).
Tal se deveu ao facto do Dr. João Rodrigues de Almeida, seu herdeiro, no testamento que assinou em 1698, não ter cumprido a cláusula testamentária que estabelecia a ordem sucessória, própria dos morgados, após o seu falecimento, que era assim: primeiro «o filho mais velho, e não tendo filho nem filha, o herdeiro mais chegado, preferindo-se em igual grau o varão à fêmea», e ao contrário, ter escolhido para universal herdeira e administradora do morgado uma sobrinha, D. Ana de Miranda de Almeida, que era casada com o capitão-mor de Farejinhas, Francisco Teixeira Pimentel, opção essa que foi contestada em 1713 por João de Freitas, primo da contemplada e filho da irmã do 1º morgado.
O caso arrastou-se indefinidamente pelos tribunais e no testamento de Manuel de Freitas, descortina-se a razão do arrastamento. Com data de 1783 ali se diz que «mais nomeava todos os direitos ao vínculo da capela de Santo António, da vila de Castro Daire, a seu filho Manuel, porque suposto de se compor com aqueles senhores foi ele ser pobre e eles serem muito ricos e não ter posses para demandas tão graves».
Confessando-se «pobre» e, por isso, incapaz competir na justiça com «aqueles senhores (...) por serem muito ricos», o filho, Manuel de Freitas Pinto Sousa, prossegue com a ação, e apesar do pleito ter sido resolvido a seu favor, tendo mesmo tomado posse dos bens, a outra parte, mais poderosa, não desistiu e a demanda continuou. À sua morte, ocorrida em 1816, o pleito não estava ainda resolvido e é o seu filho, António de Freitas Pinto Sousa, miguelista confesso, é que vai continuar a batalha judicial. (cf. meu livro «Castro Daire, Indústria, Técnica e Cultura» capítulo «Liberalismo», editado em 1995 e «Castro Daire, Capela de Santa António», editado em 2014)