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sábado, 05 abril 2025 12:49

CHEGADA DE VASCO DA GAMA À ÍNDIA - ADEREÇOS ORNAMENTAIS

Escrito por 

EXPERIÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Tenho vindo a publicar no meu mural do FACEBOOK as folhas dos LIVROS DE PONTO e FOTOGRAFIAS respetivas das TURMAS que a SECRETARIA DA ESCOLA nos entregava no princípio de cada ano letivo. Sem comentários. Tenho andado com falta de inspiração para alinhavar meia dúzia de letras e transmitir algo que não julgue uma “vacuidade”. Hoje, porém, surgiu-me na lembrança um episódio digno de contar. Aí vai:

Vindo de França, filho ou neto de emigrantes, retornou à Pátria, e decidido a concluir os estudos iniciados no estrangeiro, matriculou-se, ou foi matriculado, na ESCOLA PREPARATÓRIA DE CASTRO DAIRE.
Calhou ser meu aluno integrado na turma correspondente ao grau de escolaridade reconhecido lá fora.

Estávamos nos ANOS OITENTA do século XX e ele destoava dos mais alunos pelo “brinco” que, ousadamente, a seu gosto, usava numa das orelhas e, por isso, era olhado de soslaio pelos colegas. Olhares, às vezes, acompanhados com “dichotes” em voz baixa e troca de olhares maliciosos entre os demais colegas.

Tendo eu regressado do ultramar, (Moçambique, Lourenço Marques) com horizontes culturais que escapavam à curta vista provinciana de um Portugal Continental pacóvio, cabia-me fazer uma pedagogia inclusiva e mostrar que o uso de adornos, nos braços e nas orelhas, eram a coisa mais natural na trajetória da vida humana. Como fazê-lo para evitar que o “moço” deixasse de ser o alvo de olhares suspeitos, e levasse os demais alunos a encararem o caso de forma natural, ao nível dos gostos pessoais, sem prejuízo de terceiros?

A “viria=bracelete” ligada ao nome Viriato, o chefe dos Lusitanos, vinha a calhar. Foi por onde comecei. Mas aconteceu fazerem-se os 500 anos da chegada de Vasco da Gama à Índia. O Ministério da Educação deu orientações para que o evento fosse devidamente comemorado, com a dignidade merecida, nos estabelecimentos de Ensino. E, para ajudar à festa, distribuiu pelas escolas cartazes alusivos ao evento destinados a serem expostos e explicados historicamente.

V.GAMAoFizemos uma exposição na BIBLIOTECA DA ESCOLA. Eu tinha ali uma excelente ocasião para dar corpo às explicações dadas nas aulas, sobre os adereços humanos usados através dos tempos, independentemente do género, masculino e feminino.

Parei com a turma em frente do cartaz alusivo à chegada de Vasco da Gama e à receção do Samorim, rodeado dos seus.

Puxei do ponteiro e discorri sobre os ADEREÇOS usados pelo Samorim e sua corte, no peito, nos pulsos e nas orelhas.

A partir daí, os dichotes em voz baixa e os olhares maliciosos cruzados na TURMA deixaram de existir. O objetivo pedagógico foi alcançado.

Dizer isto hoje, quando, por Portugal inteiro, se vulgarizaram esses adereços nas orelhas, narizes, sobrancelhas e, parece que até noutros lugares mais íntimos, até parece disparate da minha parte.
Mas disparate era, nos ANOS OITENTA, tudo o que rodeava o comportamento da Turma face a um colega que usava um “brinco na orelha”. Vejam só! A bem dizer, foi há dias. Se ele vir este post fica a saber das preocupações que eu tive por forma a que ele não se sentisse excluído da TURMA, cujos discentes, femininos e masculinos, eu julgava a todos “meus filhos”.

Com efeito, da  mesma idade, os meus filhos mostraram-me o desejo de usar brincos. Autorizei. Foi um escândalo neste pedacinho de Portugal que somos. Um, o mais velho, que me deu uma neta, deixou de usar quando assim o entendeu. O outro, que me deu uma neta e um neto, continua com o adereço da juventude. E eu pergunto-me: o que tenho eu a ver com os gostos de cada um deles, ou de cada cidadão que comigo se cruza no dia a dia'?

Na vida e na PEDAGOGIA livresca aprendi e ensinei a «respeitar a diferença».

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.