Imprimir esta página
sábado, 29 fevereiro 2020 11:19

MENINA POSTADA À JANELA

Escrito por 

TENTAÇÕES

Na nossa cultura e viver coletivo tudo o que se desvia do social normativo, põe na boca da generalidade das pessoas um "credo", um "abrenúncio" ou a expressão "coisas do demo".  

 Será isso?


Ela postava-se à janela, de manhã cedo, e dali não saía todo o dia, chovessem raios ou coriscos. Ela não tinha medo, nem receio dos riscos que corria de ser fulminada e, às vezes, de janela escancarada, sobre o peitoril debruçada, mostrava os níveos e rijos seios. E, o que era melhor ainda, coisa linda, as zonas pintadas do corpo que a paleta de pintor extravagante, num instante,  ali deixara na puberdade.

Um escândalo para o povo, para a generalidade das pessoas do bairro todo. Mas, para nós (carriças com catarro, ao vermos aquelas coisas boas, aquele fruto proibido) ela era um anjo do céu caído, um anjo daqueles que um deus provocador ali pousara com a finalidade (que crueldade, estou hoje em crer!) de que na Terra, cada pecador ainda novo, na inocência e na viril potência da juventude, sem clemência, ardesse no inferno, mesmo antes de morrer ou chegar à senectude.

abílio-pena - REDUZIDA - CópiaE ardia mesmo, mas de gozo e felicidade. Quem é que resistia ao fogo depois de ver as marcas daquela paleta? Se tem veia de poeta, ó leitor amigo, faça o que lhe digo, faça disto  um poema, acerte na rima, faça, faça, (o tempo passa) e verá que valeu a pena.

Isto, se for jovem, claro está. Pois se for um velho jarreta (a palavra rima, mas não dá, não serve),  se a idade lhe tolhe o desejo e o movimento, dê asas ao pensamento e faça, faça como quem sabe, recorra  a Camões, use a verve, use a Lingua, não tema, use o tema, ria, ria,  diga chalaça, após chalaça e escreva com humor as humanas e eternas verdades:

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem, se algum houve, as saudades.


Abílio/fevereiro/2016

 

NOTA: : postado no Facebook em 29.02.2016.

Ler 939 vezes
Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.