Na água do tanque, o suor ficava
Essa marca de esforço e de trabalho
Esfrega-que-esfrega, lava-que-lava
De uma só carta, ou de todo o baralho
Bate-que-bate, o segredo girava.
Ali dizia- se o bem e dizia-se o mal
Olhava-se de soslaio, se convinha
Que de momento, ao lado, a vizinha
Não ouvisse aquela notícia matinal.
Lavadouro público, rede social
Jornal de todo o mulherio da aldeia
Espaço de comunicação popular
Onde se pintava, rabiscava e lia
O quotidiano da povoação inteira.
Aqui não há censura. Aqui ninguém se cala.
Estamos a viver no império da fala,
E no ar se apaga o registo da coisa dita.
Coisa dita que, tempo atrás de tempo,
De rasteiro ou de elevado pensamento
Somente ficará no império da escrita.
Calado e mudo, sem mulheres à roda
O poeta ouve tudo, neste património.
E inspirado pelas musas ou pelo demónio
É por imperativo do dever e não por moda
Que dá cor, luz e vida, ao espaço morto
Que já vivo foi de força, energia e alento.
Ao vê-lo, ao reparar no seu estado
Qual o poeta que, passando ao lado,
Não veja, não sinta, não ouça bem atento
O que diz, chora e canta este monumento?
Abílio/agosto/2015