Imprimir esta página
domingo, 09 agosto 2015 13:45

LAVADOURO DA ALDEIA

Escrito por 



Duas ou mais mulheres lavam aqui a roupa.
Eu ouço verdades, eu ouço balelas 
Pois falar da aldeia toda é cousa pouca
Neste pequeno espaço, somente delas.



Lavadouro

Na água do tanque, o suor ficava 

Essa marca de esforço e de trabalho


Esfrega-que-esfrega, lava-que-lava

De uma só carta, ou de todo o baralho

Bate-que-bate, o segredo girava.


Ali dizia- se o bem e dizia-se o mal

Olhava-se de soslaio, se convinha

Que de momento, ao lado, a vizinha

Não ouvisse aquela notícia matinal.
Lavadouro público, rede social
Jornal de todo o mulherio da aldeia
Espaço de comunicação popular
Onde se pintava, rabiscava e lia
O quotidiano da povoação inteira.

Aqui não há censura. Aqui ninguém se cala.Fontanãrio-2

Estamos a viver no império da fala,
E no ar se apaga o registo da coisa dita.
Coisa dita que, tempo atrás de tempo,
De rasteiro ou de elevado pensamento
Somente ficará no império da escrita.


Calado e mudo, sem mulheres à roda
O poeta ouve tudo, neste património.
E inspirado pelas musas ou pelo demónio
É por imperativo do dever e não por moda
Que dá cor, luz e vida, ao espaço morto
Que já vivo foi de força, energia e alento.
Ao vê-lo, ao reparar no seu estado
Qual o poeta que, passando ao lado,
Não veja, não sinta, não ouça bem atento
O que diz, chora e canta este monumento?

Abílio/agosto/2015



Ler 1322 vezes
Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.