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sexta, 13 setembro 2019 09:28

LITERATURA ORAL

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LITERATURA ORAL

Da recolha que fiz em Castro Verde antes de ir para Beja e depois lá retornar, constam duas “décimas” da autoria de um tio da minha mulher, morador aue foi na aldeia de ENTRADAS, sobre quem já publiquei extenso trabalho com o título “UM LAR, UMA FORTALEZA”.

 Nesse texto publiquei uma dessas “décimas”, na qual ele me confiou, em verso, as razões que o levaram a optar por uma vida de clausura fora do mundo, durante anos, mas ao mundo atento, como então escrevi. Razões que jamais confiou a outrém em conversa ocasional ou puxada a propósito. Esta outra “décima” completa o sentido da primeira e deixa bem claro quão determinantes e sofridas são as emoções humanas quando verdadeiramente sentidas:

Mote

Adeus mirrada caveira

Foi-se a tua fantasia

Ó morte que me roubaste

O espelho onde me revia

I

Quem me havia a mim dizer IMG 2605

Que neste lugar sagrado

Reduzida a este estado

Ainda te vinha ver.

Sem ao menos conhecer

Das fuas feições a primeira

Eu ver-te desta maneira

Rogo a Deus e peço

De ti nunca me esqueço

Adeus mirrada caveira.

II

Acabou tua existência

Foi-se a tua formusura

Eu ver-te nesta figura

Peço a Deus paciência.

Nem uma só aparência

Tens do que eras algum dia

Teu prazer, tua alegria

Neste mundo já não gozas

Que é das tuas posses amorosas

Foi-se a tua fantasia.

III

Do que eras não te assemelhasIMG 2605

Teus sinais estão perdidos

Que é dos teus olhos luzidos

Essas tuas sobrancelhas

As tuas faces vermelhas.

Ó terra que já gastaste

Da minha vista levaste

Minha maior felicidade

Dos olhos a claridade

Ó morte que me roubaste.

IV

Teus ossos já lá estão

Pelos meus esperando

Sem saber a hora, nem quando

Um dia se juntarão.

Resta-me a conclusão

Estar em tua companhia

Nunca me esqueceria

De quem a pó se reduz

Perdeu a clara luz

O espelho onde me revia.

 

Manuel Mestre Brito

Entradas.

 

Naquela zona altentejana a família BRITO era socialmente muito considerada, e de não menos consideração eram os seus “teres e haveres”. Dessa família herdei, por parte da minha mulher, a peça histórica que ilustra a primeira crónica e aqui se repõe novamente. Um chocalho gigante daqueles que ornamentavam o seu gado quando com ele se deslocava à FEIRA DE CASTRO, a 10 Km de distância. E mal ele saia de Entradas, logo os do “Crasto” diziam: “já la vem o Brito”, tal era a sinfonia da chocalhada, ultimamente elevada à categoria de património imaterial da Unesco.









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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.