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domingo, 26 maio 2019 06:58

LIVRO ABERTO E ILUSTRADO (b)

Escrito por 

«A VERDADE É COMO O AZEITE VEM SEMPRE AO DE CIMA»

BOMBEIROS - Prós e Contras - 2

Pela minha última crónica o atento leitor a residir no concelho, no país ou no estrangeiro, afastado do parlamento das «quatro esquinas», ali ao lado do jardim municipal, ficou a saber o juízo crítico e fundamentado que o Dr. Aurélio Loureiro, fez no «prefácio» ao meu mais recente livro, editado pela Câmara Municipal, a quem cabe «colocar no mercado dos exemplares produzidos».

 

 

 

SERRADOFicou a saber que, antes mesmo de estar à venda, o livro foi badalado e  comentado na ágora vilã,  o parlamento caseiro onde alguns «amigalhaços» exercem a sua cidadania,  satisfazem o seu ego de palito no canto da boca, bem ao contrário daqueles que, ao nível da comunicação social, tudo fazem para que as pessoas e as instituições entrem no século da comunicação e do conhecimento, ascendam, por intenções, palavras e obras, ao estatuto cultural e civilizacional exigido nos tempo que correm. Ficou a saber que, no exercício da cidadania, cada qual tem o seu desempenho e responsabilidade na gestão da «coisa pública» em benefício (ou prejuízo) das instituições. Ficou a saber que a história, a todo o tempo, regista as atitudes e os factos, não cabendo ao historiador, mas sim aos protagonistas dessas atitudes e desses factos o «agradável» ou «desagradável» que eles transportam. Ficou a saber que alguns «desagradados» com a edição deste livro, por não se honrarem com posições pessoais que assumiram  publicamente  no passado, se negam a si próprios. Isso é lá  com eles. Não é com o historiador. Ficou a saber que, entre gente de BEM, toda a atitude benemérita em prol de uma causa nobre é sempre o que é, independentemente dos gostos e desgostos daqueles que se arvoram em servidores e donos das instituições, que tudo deviam fazer para defender os interesses delas, em vez do contrário. Confundem a história das instituições com a história dos amigalhaços e dos compadres. Ficou a saber que, não obstante a bondade dos objectivos que as instituições perseguem, os seus gestores não são isentos de críticas e que a matéria registada em actas é matéria de história e não «jogo-de-esconde-esconde».  Ficou a saber do apelo que fiz para que, no sentido do esclarecimento, viessem «artigos, reclamações, ofícios, abaixo-assinados, protestos, mas fundamentados». Fundamentados, alicerçados em factos e não no «diz-se, diz-se» da esquina. A tentativa «incendiária» de convocar reuniões para nelas manipular opiniões e vontades contra o que se desconhece, foi chão que deu uvas. Em todas as instituições e em todos os corpos sociais há pessoas esclarecidas que já não se deixam ir em cantigas.

Bombeiros-1-2.Castrensede 10-08-1919São pessoas esclarecidas, sim, mas todas merecem sê-lo. E é por isso que, no seguimento da crónica anterior, a fim do leitor saber algo mais sobre este livro, sobre os «prós e contras» que em torno deles surgiram, aqui estou de novo. E cabe adiantar aqui que, não havendo em Castro Daire «Saramagos», não faltam por aí «Sousa Laras». Não havendo «Salmans Rashdies» não faltam «Aytolas Komenhis». Não faltam os nossos «Torquemadas», os «Pina Maniques», essas almas caseiras ávidas de autos-de-fé, de chamas e fogueiras. Tretas? Não. Agora sem nomes, mas a seu tempo, lá mais para diante, eles serão nomeados com todas as letras.

 Voltando, então, ao livro, como o leitor já é conhecedor de parte do «prefácio» assinado pelo Dr. Aurélio Loureiro, que teve, também, a gentileza e o trabalho de corrigir as provas tipográficas, saltemos para o fim da obra, para o capítulo que designei apropriadamente «NA HORA DO RESCALDO». São desse capítulo os seguintes excertos:

«Vimos que no incêndio deflagrado na casa do senhor Seixas [em 1930] o bombeiro Bernardino Coelho, carpinteiro, vivendo somente da sua profissão, caiu sobre os vidros,  feriu-se numa mão e ficou impossibilitado de trabalhar durante uns dias. Vimos que não era justo um bombeiro, depois de ter prestado um trabalho em que nada ganhar, tenha ainda por cima de sofrer, à sua custa, todas as consequências do seu desinteresse.

Vimos, em 1966, a Direcção da Associação criar «duas bolsas de estudo para a atribuir, anualmente, a filhos de bombeiros pobres, a fim de frequentarem o ensino secundário, recompensando assim o esforço, a abnegação e o sacrifício do Corpo Activo desta Associação».

Vimos isso tudo. Pois vimos. Gente humilde, gente anónima, homens e mulheres, povo do povo, aqueles e aquelas que tocaram o sino a rebate contra a prepotência do COPCON, aqueles e aquelas que nessa altura afogaram as labaredas da revolução [1974], eram os mesmos, era a mesma gente humilde, o pé descalço, que  corria, desabridamente e sem distinção, para afogar os fogos que devoravam teres e haveres das casas burguesas e fidalgas, recheadas com móveis de estilo, tal como, sem distinção, corriam, igualmente, a afogar o fogo nos palheiros dos camponeses e nos tugúrios mobilados com enxergas e camas de ferro, dos seus companheiros de infortúnio.

Este livro é dedicado e oferecido a essa gente humilde. Foi em todos esses protagonistas, bombeiros e músicos, que busquei coragem e alento para o fazer e não desistir a meio. Foi neles também que me inspirei ao congeminar a ilustração da capa. Bombeiros que davam à «bomba»; mulheres que, com seus canecos e vasilhame diverso,  esgotavam tanques, poças, minas e quintais, para abastecerem de água esse equipamento;  músicos, elementos da Banda que, nos meses quentes de Agosto, mês de romarias, foguetes e procissões, davam ao fole a soprar e a dedilhar os instrumentos por essas aldeias fora, pára, arranca, sobe e desce, passo certo, sob calor abrasador, afogueados pela farda, colarinho apertado. A todos eles se deve, com um certo sabor heráldico e nobre, a disposição dos elementos que, na capa, simbolizam as duas corporações historiadas: «Os Nossos Bombeiros» e a «Nossa Música».

E nesta minha inspiração e arranjo, não pode ser vista qualquer má vontade contra as elites vilãs que, desde a fundação dos Bombeiros, tiveram a responsabilidade de levantar, manter de pé e de gerir a Associação, ultrapassando muitas vicissitudes, muitos altos e baixos, sempre com dificuldades financeiras, resolvendo-as com recurso a «bandos precatórios», cortejos e outros peditórios.

Vimos nisso a burguesia e a nobreza rural durante a Monarquia, com D. António de Faro e Noronha. Vimos nisso, D. Antero Herculano Teixeira de Aguilar, durante a República. Vimos nisso, engenheiros, doutores, médicos, funcionários judiciais e administrativos, empresários, comerciantes.

[Mas os tempos mudaram]:

bombeirosÉ que o tempo em que as «elites vilãs ou citadinas», de caneta em punho, vocacionadas para dirigirem e gerirem as Associações do Bombeiros (sem sequer serem bombeiros) encontravam no «pé descalço», no «analfabeto», no «empregado de comércio» ou no «operário da indústria», a mão-de-obra disponível para darem «à bomba» e pegarem na «agulheta», acabou. Vai longe o tempo da «Companhia de Caldo e Nabo» fundada em Lisboa, no ano de 1834, Companhia, aliás, que inscreveu no código genético das corporações de bombeiros o léxico militar que ainda hoje perdura. Ele é o «quartel», ele é as «companhias», ele é os «batalhões», ele é as «secções», ele é o «quadro de reserva», ele é o «cadete», ele é o «aspirante», ele é o «comandante», ele é a «parada», ele é a «continência», ele é a «farda»... vai longe esse tempo, dizia, e hoje, não obstante essa marca militar, os corpos de bombeiros incluem não só elementos com a escolaridade obrigatória, mas também com cursos médios e superiores.

É tempo, pois, de dar aos bombeiros o que aos bombeiros pertence, a gestão das suas Associações e a ocupação, por direito próprio, dos lugares cimeiros nas estruturas nacionais. É tempo de se fazer um «25 de Abril» nos Bombeiros Portugueses. São eles, os bombeiros «com farda», que devem tomar conta do seu destino, cientes de que a designação de «bombeiros sem farda» mais não é do que a legitimação dum resquício do passado, do tempo em que de um lado estava «o pé descalço», o homem de «caldo e nabo» e do outro o cidadão de «colarinho engomado», burguês e anafado. Feito isso, no que respeita ao «pessoal dirigente» e «comando» a lei não precisará de aludir a «licenciados e oficiais das Forças Armadas na situação de reserva», quantos destes últimos, arrumada a farda, perdido o estatuto fora dos quartéis, acordados tardiamente para o «voluntariado», nos quartéis dos «soldados da paz» encontram a continência que deixou de lhes ser feita pelos «soldados da guerra».

Que este livro contribua, ao menos, para uma reflexão sobre isso tudo. Tive alento para nele consumir muitas e muitas horas de investigação e de trabalho. Dias e anos. Tive força e vontade para levar até ao fim esta cansativa tarefa. Mas sentir-me-ei compensado, satisfeito e feliz se os leitores, bombeiros, músicos, sócios e não sócios, tiverem paciência para o ler, a eito, sem desfalecer, até à última linha. E não duvido que assim procedam todos aqueles que se interessam pela Historia Local. Esses sabedores e diligentes, não deixarão de assumir-se como motores de inovação e mudança, pois o país, o concelho e as instituições bem precisam do seu esforço esclarecido e do contributo empenhado. Dos outros, daqueles que tratam apenas da sua «vidinha» não há nada a esperar. Esses, o mundo que herdaram será o mundo que deixarão por herança».

Ora aqui está um bom capítulo, todo ele -  para o cabeçalho do «abaixo-assinado» que os «desagradados» com a edição deste livro procuram fazer, manipulando os elementos menos atentos e esclarecidos. Mas alguns há que, declaradamente, não vão nisso. Não tomam posição no escuro e só depois de lerem o livro é que sim. Esses são os cidadãos de boa consciência. Não vão em pressões, manipulações e interesses do momento. Assumem a sua cidadania não se deixando arregimentar sem o esclarecimento devido. Querem exprimir opinião fundamentada. Ainda que alguns haja que tendo já os fundamentos, não tenham ainda opinião. Estranho, não? Mas cada um é como cada qual.

Este capítulo é bastante esclarecedor no que respeita ao meu entendimento sobre o papel dos bombeiros através da história. O que penso e o que digo. O que penso e o que escrevi, letra por letra. Ele é um autêntico hino de glória ao papel histórico dos bombeiros, à entrega e desempenho dessa gente humilde que tudo dava a troco de nada. Outros tempos! Hino à solidariedade e à abnegação. Quem disser o contrário mente. Pode usar o seu estatuto, exercer o poder dos galões, mas não exerce o poder da autoridade. Aquela que advém da palavra, do registo e da verdade dos factos.

E termino como comecei, transpondo para aqui a frase lapidar que encontrei numa das actas da Direcção, dita como epílogo da resolução de uma questiúncula interna, isto é, a propósito do Comando não querer que a Direcção fizesse uso das viaturas sem o seu consentimento: 

«Com a colaboração de todos o passado será motivo de lição, o presente de trabalho, e o futuro de esperança». (pp. 286 do livro).

De facto, o «passado será motivo de lição», mas só para quem quiser aprender.

 

cf.  no «Notícias de Castro Daire», de 24 de Janeiro de 2006.

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PS:: transcrever este texto, publicado em 2006, para esta minha página , neste dia  26-05-2019, dia de leições para o PARLAMENTO EUROPEU, estando envolvidos na POLÉMICA, desde o princípio ao fim relacionada com a sua venda e locais de venda  (COISA QUE AINDA NÃO ACABOU, COMO SE VÊ...POIS MAU PAI É AQUELE QUE ABANDONA O SEU FILHO SEM SABER O SEU FIM NEM FAZER VALER OS “DIREITOS DE OUTOR”)  os eleitos para os poderes concelhios, leva-me a dizer que o livro não é apenas «LIVRO ILUSTRADO». Ele é também «ILUSTRATIVO» de como grassam por aqui as «conivências», os «compadrios», os «amiguismos» as «conveniências», as «clientelas”. Tudo vale para OCULTAR A VERDADE do que se passa nas nossas INSTITUIÇÕES.  Mas voltarei ao assunto, pois ainda estou vivo e lúcido bastante para poder deixar de exercer a minha cidadania com a devida elevação democrática sob o lema «LIBERDADE/RESPONSABILIDADE»

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.