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segunda, 04 setembro 2017 13:15

CUJÓ: UMA GENEALOGIA (7) (SÉTIMO)

Escrito por 

HISTÓRIA VIVA

Eis o último lanço da jornada. O sétimo, simbólico e sacramental número este. Nele cabe dizer que do matrimónio de António Pereira Amador com Líbia Cândida de Jesus (no casamento:, dita Silva) realizado em 1879, 4 anos depois do nascimento de  Florinda Correia, filha de Felismina de Jesus, nasceu a seguinte prole:

 

Ema de Jesus Pereira Amador, Dulce Pereira Amador, Laureana Pereira Amador e Alípio Pereira Amador.

A Ema casou com Francisco Teixeira Seabra Dias e deste casal nasceram:

Josefina Amador de Seabra e Melo, António Amador de Seabra e Melo, Mário Amador de Seabra Dias, Manuel Amador de Seabra Dias e José Teixeira Seabra Amador.

Entre estes  irmãos encontram-se os dois primos que apadrinharam os dois bisnetos de Felismina de Jesus,  também eles  a revelarem claras «aptidões para a Arte», quer em madeira, quer em pedra. Filhos de Salvador de Carvalho (um dos SETE filhos de António Tereso e Florinda Correia e de Gabrielina Pereira...deles (e não só)  falei, há anos, no meu velho site, "trilhos serranos.comno botão ARTES, longe de imaginar que me viria a servir dos textos passados todos estes anos, para ilustração de um raciocínio e fundamentação de um argumento.  De lá transcrevo os textos que se seguem. Eles, levando em conta tudo o que atrás ficou dito,  são como que o  resultado de um  teste ADN de descendência, sem necessidade de recorrer  a exames laboratoriais ou forenses.

 Os textos respeitam a cronologia da vinda ao mundo das pessoas referidas,  do mais velho para o mais novo, assim:

IMG 2357«1 - António Pereira de Carvalho Amador, natural de Cujó, concelho de Castro Daire, assentou praça voluntariamente no R.I 14 de Viseu e, cumprido que foi o serviço militar, entrou nas fileiras da GNR como soldado. Mas «soldado raso» não era posto que satisfizesse os seus sonhos e ambições. Elemento de uma corporação hierarquizada onde assenta a segurança da República, estudou,IMG 2358 aplicou-se à profissão que abraçou e de promoção em promoção, depois de frequentar a Escola de Oficiais de Águeda, chegou a capitão, patente com que passou à reserva/reforma. 

Residente em Cacém, para não fugir ao código genético da família,  resolveu dar aso à sua imaginação e, fazendo uso da madeira e do canivete, no seu «atelier» já perfila, em sentido, o pelotão que ilustra este registo.

     Mas ele não se ficou pelos soldados. Das suas mãos e ferramentas também saiu a imagem de S. António, ciente, seguramente,  de que este Santo não era apenas casamenteiro, pois não falta bibliografia a afirmar que o taumaturgo se colocou ao lado dos Portugueses nas lutas contra os castelhanos e «bem se tem testificado sua assistência no Alentejo, pois, em Olivença, foi visto a fazer o ofício de general e juntamente de artilheiro errando pouco em seus únicos tiros», tal como diz António de Velo Lira, no livro «Éspelho dos Lusitanos, em o Cristal do Psalmo 43» Lisboa, 1753».

 

Zé-1«2 - JOSÉ PEREIRA DE CARVALHOZé-2

Natural de Cujó, concelho de Castro Daire, cedo deixou a sua aldeia natal para «trabalhar nas obras», em Lisboa ou onde as houvesse para ganhar a vida.

Um dia resolveu ir para Moçambique e começando por ser guarda-prisional chegou a Administrador de Posto. Regressando a Portugal por força da descolonização foi integrado nos quadros da função pública e, por concurso, foi nomeado Chefe de Secretaria da Escola Preparatória de Castro Daire.

Logo que foi aposentado resolveu recorrer aos velhos saberes da mocidade, ao manejo do pico e da maceta e toca de esculpir «figuras» várias, que vão desde «santos», a «pecadores», «relógios-de-sol» a «cães», «gatos» e «aves».  Na sua simplicidade artística elas aí estão como fruto de uma «reforma» ativa».

«3 - ABÍLIO PEREIRA DE CARVALHO

cavalo - CópiaDesde que, com os meus dezasseis ou dezassete anos,  com uma talhadeira, ponteiro e maceta, arranquei do tampo de chapa de um bidão de 200 litros o cata-vento, em forma de cavalo, artefato que, mais de 50 anos, perdurou no topo do telhado da casa dos meus pais, em Cujó, cata-vento recentemente recuperado e trasladado para o cimo do telhado de uma sobrinha minha, ali nas vizinhanças, nunca perdi a vontade de arrancar outras figuras escondidas nos materiais que a natureza põe à disposição do Homem.

Aquele animal de lata é para mim o símbolo da minha cavalgada na vida, começada ali, naquela aldeia serrana, contra o vento e contra o tempo.. Primeiro, representou o cavalo de Afonso Henriques a combater os mouros. Depois, já longe de Cujó, de nariz metido nos livros de História ABÍLIO-1Universal, transformou-se no «Bucéfalo» de Alexandre Magno, contra Persas e todos os reis e povos que ele submeteu aos seus domínios. Por último, quedou-se no «Tornado» de Zorro, sempre do lado do povo humilde, contra tiranias e submissões forçadas a impostos e vassalagens.

Mas os tempos de estudo e de profissão de professor de «História» de Português», durante anos, impuseram que deixasse em descanso o martelo, o formão e a goiva  ainda que  tais ferramentas figurassem arrumadas na minha banca de trabalho, na garagem, a competirem com os livros alinhados nas estantes da Biblioteca.

Assim, logo que tive tempo, com uma tábua de cerejeira na frente, peça solta que pertenceu ao postigo de uma porta antiga, eis que, neste mundo cão, de dogmas, de tabus e ritos, de moralistas e de libertários, de seguidores de catecismos e de livres pensadores, ABÍLIO-2-ABÍLIOrefletindo sobre o mundo, sobre o homem, sobre a história,  sobre as artes e as letras, desde a Antiguidade aos nossos dias, passando pelas Américas, Áfricas, Ásias, tendo em mente a preocupação de Vergílio Ferreira sobre o «milagre da vida e o absurdo da morte» posta no seu livro «Aparição», sem obediência que não à da minha consciência, fiz «aparecer», na superfície dessa tábua, as figuras que se vêem.

Propositadamente, optei por deixar a obra inacabada, consciente como estou de que inacabadas são todas as obras humanas.  É só olhar e ver, certo, embora, de existirem tantas e tantas pessoas que olham e não vêem».

 

NUNO-1

«4 - Nuno Pereira de Carvalho, natural de Cujó, concelho de Castro Daire, correu terras e

NUNO-2mares como profissional de Marinha até se aposentar. Residente na Caparica, perto do mar, certamente marcado pela ânsia de chegar a terra com saudades da família e dos amigos enquanto esteve no ativo,  já na aposentação, com um simples canivete dá asas à sua imaginação criadora e entretém-se a fazer, em madeira, a estrutura para «relógios»,  a velha máquina de medir o tempo inventada há séculos e bem assim objetos domésticos, guarda-joias que são autênticas relíquias». 

Felismina de Jesus, mãe de Florinda Correia, não contraiu matrimónio com o marceneiro António Pereira Amadorcujas «aptidões para as artes» foram proclamadas no ato do seu enterro por Camilo José de Carvalho, em 1908. Mas, pelo que se mostra, mesmo à margem do sétimo sacramento, não fora o ventre, o cálice, o Graal de Felismina de Jesus (sugestivo apelido)  a transportar e a transmitir os seus genes artísticos, esta página, onde figura a arte de quatro dos seus  bisnetos (quatro dos SETE filhos e filhas de Salvador de Carvalho e Gabrielina Pereira) nunca teria sido escrita. Os pais, avós e  bisavós bem podem sentir-se legitimamente orgulhosos por verem confirmado o ditado: «quem sai aos seus não degenera».  Eles e a demais parentela, toda aquela que, derivando do tronco comum, são ramos e copa da frondosa ÁRVORE GENEALÓGICA desenhada por Amadeu Duarte Pereira,  aquela que eu aqui deixo truncada, ciente de que, aclarada a paternidade da avó Florinda, fiz o que pude e o que devia.

E já que me foi dado elaborar esta «joia de família», digna de ser usada por qualquer membro dela, servindo-me do «ouro de lei» garimpado pelo meu primo, Amadeu Duarte Pereira, cedido assim mesmo, ao natural, pepita a pepita, tal qual as extraiu das minas burocráticas institucionais, vou deixar por momentos o papel de historiador e assumir o brio, a arte e o jeito de ourives experimentado com oficina e loja abertas ao público. 

Escolhida a forma oval, medalha de abrir e de pendurar ao peito, as duas partes encaixadas e presas por delicadas dobradiças, fecho a preceito, faltam somente os acabamentos exteriores e interiores. Maçarico e alicates à mão, aproveitando a ductilidade deste metal precioso, aqueço e distendo uma pepita, expurgo dela a chicória da maldade, da hipocrisia e da inveja, transformo-a num fio, dou-lhe o nome AMOR e o formato oval da medalha. Pego noutra pepita faço o mesmo e dou ao fio o nome CORAGEM. Repito a ação e dou ao fio o nome AVENTURA. Outra ainda e chamo ao fio JUVENTUDE. Com os quatro fios entrelaçados faço um cordão ovóide e nele envolvo uma esmeralda, uma pedra preciosa, lapidada e polida, trazida do Brasil, de sítio e tempo incertos. Faço a incrustação do conjunto na tampa frontal da medalha e no interior, naquelas concavidades em forma de abóbada celeste, gravo os nomes de FELISMINA DE JESUS e de  FLORINDA CORREIA. Mãe e filha que o meu PAI, Salvador de Carvalho, seu descendente, com vincado conceito de família, manteve para sempre unidas, apesar de ignorar o trabalho e começo dramático, dolorido e afetivo destas duas vidas.

 

FIM

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.